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O paisagista contemporâneo

Escrito por 

 

Carlos Mota nasce em Ponta Delgada, Portugal, estudou em Bruxelas, onde se formou em Arquitectura de Interiores no CAD (Centre des Arts Décoratifs e Pintura na École des Arts D'lxelles) e actualmente reside e trabalha em Lisboa. Uma residência artística em Ouro Preto, no Brasil, abriu-lhe as portas do Palácio do Planalto, em Brasília, onde tem actualmente exposta uma das suas obras.

Focando a sua pintura e sendo açoriano, há algo de ilha no seu trabalho?
Carlos Mota: As nossas vivências e o lugar onde estamos sempre transmitem algo. Eu inspiro-me muitas vezes nas paisagens para o abstracto, nunca se identifica verdadeiramente que seja paisagismo. Existem um curador que dizia, que eu tenho um paisagismo contemporâneo, ou seja, no projecto de Ouro Preto, onde fiz uma residência de três meses, inspirei-me na alma daquela zona, nas calçadas, porque eram ricas e no céu, que era magnífico. E depois, usei os pigmentos de Minas Gerais, introduzi a palete de cores deles, através de um professor universitário, gemólogo, que me ajudou a perceber esse esprecto de cores da região. A partir daí eu desenvolvo à minha pintura, geralmente é sempre assim.

O título "great finds" tem a ver com tudo isso, com essa descoberta dos pigmentos, da beleza pujante natural do Brasil e dos cheiros, de tudo o que o rodeava em Ouro Preto?
CM: Eu tive uma exposição grande, chamada "raft" e pensava que este projecto ia continuar no Brasil, mas como cheguei à Ouro Preto para fazer a residência a partir daí "achei" essa região. Na primeira semana encontrei este professor magnífico, o Maurício de Barros, que me pôs ao corrente de tudo o que eram pigmentos, porque é uma região de imensos minérios e aí abri a minha alma e surgiu este título. Não foi a arquitectura, porque é recente, nem o verde, não foi nada disto, à minha inspiração resultou da observação, porque um artista não olha, observa, por isso, observei as calçadas e o céu e todas as formas da "great finds" são esses croquis, com oito paletes de pigmentos da região, onde introduzi o vermelho que não tem nada a ver com o restante espectro de tons. Então, porquê as calçadas? As calçadas, porque é o único ponto, onde hoje em dia, toda a gente passa incognitamente em Ouro Preto. As pessoas passam ali, desde artistas, intelectuais, reis e rainhas, tudo passa agora como antigamente. Os escravos construíram toda aquela cidade, é bonita, é bela, nos inspira e o vermelho porquê? Porque eu acho que a própria cidade provoca paixões e também foco o sofrimento dos escravos que construiram tudo e isso doí, porque alguns amigos meus brasileiros dizem que quando chegam à cidade existe uma dureza.

Como é surgiu o convinte para a peça que esta agora em Brasília, exposta no Palácio do Planalto?
CM: A curadoria de onde surgiu este projecto correu muito bem, foi bem sedimentada, os artistas que estão em residência abordaram um tema que era o Brasil e com interesse para o país e a partir daí se gostam da obra convidam o artista para expôr. A meio da residência recebo um email a dizer que estavam interessados em ter uma obra minha. Eles estão a reestructurar o interior em termos de mobiliário e obras da arte da presidência do Palácio do Planalto, então, eu fui o primeiro estrangeiro a ser convidado. Fui uma grande honra para mim e para Portugal inteiro, creio. Ter uma obra permanente neste espaço, sendo o primeiro estrangeiro, embora exista um Picasso. Foi um presente ao final de vinte cinco anos de carreira, é muito bom.

Uma das definições para a sua pintura, é que pinta mundos oníricos, imaginários, revê-se nessa leitura?
CM: É um imaginário que observo, nunca é um ir para a tela e sonho, não. Tudo o que esta tela tem uma história, por isso, nunca ponho títulos nas obras, coloco só o nome da exposição, porque no meu caso não faz sentido, há sempre uma ligação entre todos os quadros, nesta todos os quadros tem vermelhos.

 

  

Voltando um pouco atrás, nos EUA teve uma grande exposição intitulada " adormecer no metro", esse conjunto de obras foi inspirada na arquictetura da cidade?
CM: "Adormecer no metro", de 2010, aí pintava com poliuretano, que já deixei um bocadinho, surge quando ia no metro, ao fechar os olhos vi duas viagens que me marcaram culturalmente, uma foi ao Peru e outra ao Egipto. Das 10 a 12 telas que pintei na altura, aparece um verde com muita volumetria que é o Peru e a outra parte que é o ocre que representa o Egipto. Estes quadros transmitem muitos dos meus sentimentos sem ninguém saber, foi nesse sentido. Os ocres se reparar não tem relevo quase nenhum, são quase monocromáticos, apesar de ter muita matéria é tudo muito liso, plano.

Em relação as cores que usa nas obras, já abordou aqui o vermelho, mas há outras tonalidades que se repetem nos quadros?
CM: Há, em "we shall be melted" que esteve no Canadá e no Porto, aparece o infravermelho, mas aí tem a ver outros sentimentos. No auge da crise essa cor aparece não como paixão, mas como sofrimento, embora ainda estejámos a sofrer, foi à minha forma de transmitir os meus pensamentos ao nível do momento actual mundial.

É difícil ser artista só em Portugal? Por isso é necessário abrir horizontes para ser reconhecido como tal?
CM: Não é fácil, mas também não é com facilitismo que se fazem as coisas. Eu já ando a fazer exposições públicas desde 1993 e agora, há algum tempo, começo a ter algum reconhecimento. Eu acho que é bom as pessoas terem essa ideia de partilha, no sentido, de aproveitar os conhecimentos que tem ao longo do tempo, porque só quando começámos a ter um certo currículo é que somos convidados e assim seleccionámos os projectos que queremos. Eu a partir de 2009 comecei a sair, fui para Boston, já estive este ano no Canadá, no ano passado estive em Itália e Espanha. É uma luta constante, mas sair é importante, quando regressámos voltámos com outros olhos, os portugueses são assim mesmo, infelizmente, sabe tanto como eu, que não é fácil. Contudo, é sempre positivo sair, nem que seja para conhecer colegas nossos, que estão muito bem ao nível internacional. O meu actual projecto "great finds" vai continuar lá no Brasil e virá posteriormente para Portugal, se não fosse por isso, nada disto teria acontecido, é necessário ter intercâmbios, parcerias.

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