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Ilhéstico 1

Escrito por  yvette vieira fts yvette vieira, academia

 

Um roteiro de arte contemporâneo envolvendo uma nova geração de artistas madeirenses, nasceu há cinco anos na Porta 33, mas só foi possível concretizar em 2019 graças ao esforço e persistência de Cecília Vieira de Freitas e Maurício Pestana Reis que em conjunto com uma equipa multidisciplinar e a curadoria de Miguel von Hafe Pérez trouxeram à cidade do Funchal, “gente cheia de mundo dentro, gente que, a partir deste território, quis e soube erguer a sua voz no mundo” e que se pode visitar até dia 2 de Novembro. 

O “Ihéstico” é assim para Miguel von Hafe Pérez, “um projeto que pretende celebrar os 30 anos da Porta 33, homenagear um percurso que é único em termos culturais na ilha da Madeira e festejar também a presença de artistas que têm no fundo vindo a lucrar com a atividade desta instituição. De certa maneira fecha-se um ciclo que parte de uma iniciativa de vários amigos para abrirem um espaço cultural que esta no Funchal e criar um território que é feito com colaborações nossas que é de alguma forma é repetido neste roteiro. Trata-se de uma exposição que têm território espalhado pela cidade do Funchal, isso para mim também foi muito importante, quer não só para marcar a geografia intelectual de partilha com os artistas, mas também uma geografia física da cidade que vai ser uma descoberta, quer pelos que vivem cá, quer por aqueles que vem visitar à ilha. De certa forma é um percurso que celebra então o encontro da cultura com espaços mais institucionais, menos institucionais, com espaços de alguma forma históricos também da própria cidade do Funchal e que de alguma maneira vai fazer com que as pessoas descubram esses espaços através da arte e para aqueles que não conhecem a cidade vão conhecer a livraria Esperança, a casa Caetano e outras instituições que colaboram com o projeto. As pessoas que são de cá vão ser confrontadas com propostas artísticas nesses locais até uma maneira tornar a ilha uma espécie de casa abrangente, daí também a exposição. Eu inspirei-me numa série de pintura de um grande autor português, Álvaro Lapa chamada “Campéstico”, que é a junção do campo e do doméstico e isso derivou para a palavra “Ilhéstico”, ilha e doméstico que é o transito entre artistas, muitos ficaram na Madeira, outros saíram e há uma grande diáspora de artistas madeirenses pelo mundo e eu gostava de integrar esta geração que muito curiosamente muitos deles não se conheciam e isso tem sido um fator relevante para esta exposição, para além da mostra que temos na Porta 33, temos um encontro com uma geração que se reencontra fisicamente no Funchal e oferece à cidade essa possibilidade de encontro de arte contemporâneo, que é sempre importante, porque é uma marca de identidade contemporânea.”

Com um total de 45 artistas espalhados pela cidade, o curador deste roteiro de arte contemporâneo no Funchal, ao fazer a seleção destes artistas teve sempre em mente, “os trabalhos desenvolvidos pelos artistas, não foram escolhas aleatórias, houve uma prospeção e foi feito um trabalho de investigação sobre os artistas que estão quer na ilha, quer no exterior. A partir desse momento foi-se contruindo uma seleção que dependia da qualidade do trabalho, foi-se desenvolvendo esta possibilidade de escolha e esperámos que haja mais oportunidades como estas para os artistas madeirenses poderem dar e mostrar esse trabalho. Para mim foi muito importante essa noção de que tentámos ser o mais abrangente possível ao nível territorial, não esquecendo os artistas que estão no estrangeiro e que ficam sob um manto de invisibilidade aqui na ilha. Portanto, foi importante para romper esse isolamento, que pode ser uma ilha em si própria, eles podem estar em Wentwood, ou Nova York e as pessoas no seu próprio território não conhecerem o seu trabalho e como digo foi também a possibilidade para que se conhecem entre si e a partir daqui, creio, que surgirá a possibilidade de haver uma outra comunidade interativa e posso pode ter reflexos muito positivos no próprio contexto cultural madeirense”.

Quanto as escolhas dos locais, estes não dependeram apenas da parte da curadoria, “o contexto da escolha inicial foi da Porta 33 e como eu não sou madeirense ao entrar pela primeira vez na livraria Esperança, por exemplo, foi um impacto muito forte, como também na Casa Catanho, entre outros os espaços membros expectáveis, como o mercado dos Lavradores e em suma foi essencial integrar esse tipo de espaços no projeto. Depois era também importante integrar os espaços institucionais de aqueles que estão continuamente a trabalhar com arte e que de alguma forma estivessem presentes e eventualmente um outro artista referiu o espaço que queria trabalhar, mas genericamente a escolha do espaço foi nossa. Numa segunda fase começámos a pensar quais os artistas adequados para os espaços e tive a perceção muito clara que a Dayana viesse trabalhar para este espaço na Livraria Esperança, porque ela trabalha muito com livros e era importante ela desafiar esta provocação e ela até o fez de uma forma inicial algo renitentemente, mas avançou e conseguiu resolver de uma forma brilhante.
Há uma varanda em que ela também intervêm próximo da Porta 33 e que resulta, porque sabíamos o que é que era o trabalho dela e conseguimos imaginar que tipo de solução iria estar em público, Contudo, há casos, como o de Ricardo Barbeito que tem uma intervenção na Casa Museu Frederico de Freitas, porque tem ligações familiares, o processo de trabalho dele é uma investigação em torno da sua própria família e temos casos em que alguns são mais contextuais e outros em que o enquadramento é mais forçado em que as obras ocupam os espaços, a intervenção de Pedro Pestana, no mercado dos Lavradores, por exemplo, podia estar num outro sítio, podia estar nas casas de banho do mercado e acho que vai ser uma surpresa interessante. Esse casamento foi articulado com os artistas, por vezes sugerido e ainda houve artistas que o sugeriram”.

Dia 1

  
Agora, siga-nos por este períplo por uma parte da cidade, que começa na rua das Mercês,41 fica situado o Cowork Funchal onde se pode apreciar o trabalho desenvolvido por Cristiana Sousa e Hugo Brazão, nesse âmbito o jovem artista, descreve, “Eu e a Cristiana Sousa quando soubemos que tínhamos aquele espaço disponível começamos a fazer pesquisas sobre aquela zona da Rua das Mercês e encontrámos informação sobre um convento que lá existiu, entre os séculos XVI e XVII e foi demolido no inicio do século XX. Portanto, fomos à procura de registos sobre aquele edifício e encontrámos duas historias que achamos relevantes, uma delas remete-nos para uma rapariga adolescente que foi levada à força para o convento, porque se tinha apaixonado por um rapaz que era de uma condição social inferior. Ao chegar lá não se conformou com essa clausura e então fez umas quantas patifarias e há registos de que ela tentou misturar numa sopa de favas cacos de vidro para matar as freiras todas e daí nos construirmos lá no espaço do Cowork um canteiro de cimento com favas a crescer é essa a ideia de um ciclo que vai começar outra vez.”

E essa história acabou bem ou mal? “Não há muitos registos sobre isso, há uma carta que foi enviada para o Vaticano a pedir para tirá-la de lá, elas, as freiras já não a queriam depois de ter feito isso tudo, mas não encontrei mais nada. Sei, contudo, que nenhuma freira morreu (risos). A outra historia envolve as memórias do Visconde do Porto da Cruz, há uma lenda em torno da construção desse convento, ele conta essa história e o autor também acrescenta as suas próprias memórias sobre aquele local, o porquê de ter sido construído e porque foi demolido e não há muitos registos fotográficos, ou seja, só existem textos. Ele contou que se lembrava de uma pintura que existia na capela do convento que tinha uma virgem a pisar uma cabeça de uma serpente e como ele descreve aquilo de uma forma engraçada fomos buscar a referência dessa pintura da serpente e, por isso, é que no espaço vê-se também um desenho de uma serpente que percorre as paredes e o chão, mas neste caso a serpente está a comer a sua própria cauda que é uma alusão a Ouroboros, é um símbolo que vem da antiga Grécia, de várias culturas antigas e que significa essa renovação e ciclo natural das coisas vida neste caso a cabeça da serpente está no chão que é para as pessoas que vão lá também poderem pisar”.

 

Na rua dos Netos, 24, fica localizado a ordem dos arquitetos a instalação de Magda Pereira e Samuel Jarimba, que nas palavras da jovem arquiteta surge porque, “nós ao longo do tempo temos desenvolvido pequenos exercícios de fotografar edifícios, mas era algo teórico, eram notas de campo, porque temos interesse na construção, eu sou arquiteta, sou fotógrafa e sempre tive esse interesse. Acho também que foi isso que nos levou a criar uma peça em conjunto, nunca tínhamos trabalho anteriormente”.
Para Samuel Jarimba este projeto “Acabou por ser um exercício quase inconsequente, não foi um exercício criativo apenas para esta peça, mas acabamos por aproveitar todo este pensamento e fazer quase…”
Magda Pereira remata, “a materialização de todo este pensamento que já vinha a ser construído há algum tempo. Estes exercícios de olhar mais para cima para o edifício. A peça é feita em terra, todos são materiais naturais.
SJ: Ali acaba por ser um destes exercícios que falávamos ainda há pouco, começamos a notar varias relações entre escalas, entre materiais e todos os elementos que existem ao longo da cidade. A obra de arte acaba por fazer parte daquele espaço que é a ordem dos arquitetos, era essa a nossa intenção também, foi por isso que a escolhemos, porque acaba por completar a obra.

 

MP: A peça é o elemento, é o mais orgânico em relação a todo o ambiente que a envolve e até mesmo ao contrapor as imagens que são dos edifícios, estes acabam por tornar-se também eles mais leves, por estarem ali quase a flutuar no teto e o azul também acho que remete muito, para isso, uma leveza que se calhar não é visível quando cá estamos na terra, não é? Acho que é um bocado essa relação entre o orgânico e não orgânico.
SJ:. No fundo criámos todos estes contrastes e damos a perceber toda esta multiplicidade de um mundo que existe que acaba por ser a cidade, acaba por ser este puzzle de várias peças que se podem ler, que se podem unir, uns sobrepõem-se e outros nivelam-se.

 

Na praça do Município, 9, na Casa Catanho, podemos apreciar o “Sentido” de Sara Tristão que descreve a sua intervenção como, “eu trabalho muito com objetos encontrados, na natureza e basicamente também são coisas que eu encontro num percurso que eu estipulo ou não, nas praias, nas viagens de casa ao trabalho, etc. Aqui para esta exposição eu fui ao encontro de materiais até bastante tradicionais daqui da ilha, coisas como restos de palmeiras, cana vieira e o barro a partir de uma fonte que eu própria descobri e consegui moldá-lo e criar estes objetos quase que já numa versão ritualista, uma coisa jámuito crua, muito sem intervenção nenhuma, são coisas que existem na natureza e uso-as tal e qual.

 

E porquê este espaço da Casa Catanho?
ST: Este espaço foi-me concedido, foi a primeira proposta que me deram, quando vi que este espaço verifiquei que era uma acumulação também de objetos e isto faz parte do meu trabalho, eu disse logo quero ficar já aqui e acho que faz todo o sentido. Para além destas peças, a minha prestação aqui é também uma performance em que eu vou estar cá a fazer tatuagens, amanhã e depois e isso é mesmo cru da minha prestação. Também fiz algumas peças que me vão obrigar a repensar novamente o meu pensamento artístico, porque há cerca de dois anos que faço tatuagens e então a parte artística em si acalmou um bocadinho, mas agora voltei com força.
Tens um titulo para esta tua prestação que seja uma sumula destas três instalações que tens aqui?
ST: Não pensei num titulo porque são momentos bastantes diferentes. Aquela peça ali, por exemplo, a caveira já vem comigo há imensos anos, embora sejam momentos muito dispares, eu acho que chamaria “Sentido”.

 

Na rua dos Ferreiros, na Universidade da Madeira, no Colégios dos Jesuítas, Diogo Goes, remete-nos para o seu trabalho artístico, “São caixas do correio, que depois foram enviadas, onde estão assentes os registos dos documentos de envio de expedição dos correios e interessa-me essa ideia. Aqui tento recontar a historia num outro contexto, interessou-me ir edificando com estas coisas todas, depois acaba por ser muito ornamental, também decorativo. Eu brincava com o Miguel von Hafe Pérez que tinham faltado caixas, entretanto, umas caíram para trás e a medida que as ia colocando não conseguia voltar a recoloca-las e havia sempre espaços vazios, mas surgiu a possibilidade de fecharmos ainda mais, porque há dias chegaram as caixas que trouxeram os catálogos, com o material gráfico e houve também a ideia de improviso. Não estou muito preocupado com esse lado que pode ser mais decorativo e pode fugir a essência do trabalho, o que esta apresentado é um objeto cúbico em que existe uma parede em toda a volta e eu aqui pensei fazer o objeto a partir de uma palete, eu lembrei-me que as portas das celas do Mosteiro de Alcobaça são muito estreitas e a arquitetura do edifício acompanha a reforma de Cluny e ali os monges tinham de perder peso para poder passar pelas portas. Eu queria que a ideia fosse essa, que circula-se-mos por aqui, mas a questão é que as caixas não encaixam literalmente e a determinada altura eu já não conseguia eu próprio passar, então optei por testar esta ideia de muro, isto faz parte do processo, são opções que se somam e, portanto, optei em vez de ser uma cela no Colégio dos Jesuítas, criei algo que fizesse a ponte também com o espelho que temos aqui e o amor que encerra que é aquilo que é o universo dos burros da historia arte.
A segunda parte do seu trabalho incorpora “um código de processo penal que foi encontrado no lixo. É um documento que encontrei quando eu apresentei esta peça no Teatro Municipal Baltazar Dias fomos à fundoa buscar caixas e encontramos livros e lá estava este documento, por vezes, não é preciso fundamentarmo-nos muito, achei piada nisso mesmo, a ironia de ser um processo penal, ou como encontramos esta caixa que pertence à máquina de contar notas, que diz não deitar fora, jogar com esse trocadilho da vertente economicista e uma critica ao mercado da arte, ou a sua estrutura de legitimação e o burro não tem a ver propriamente com este debate, mas sim com outras coisas que desenvolvo aqui não é o espectador que é, mas digo sempre que o jumento é um autorretrato e portanto é também sempre uma atitude provocatória”.

 

Ainda na rua dos Ferreiros, mas já no número 156, na papelaria Esperança, Dayana Lucas apresenta a sua interversão no projeto “Ilhéstico” de uma forma resumida “resulta num livro, um pouco em reação também ao excesso que há na livraria Esperança e é um livro branco onde há rasgos que os faço enquanto desenho e para além disso há também uma seleção de outros livros que estão próximos do meu ligado à questão do erotismo que também por acaso já existia neste parapeito. Achei interessante também este lugar muito forte em termos dos vitrais e, portanto, tentei aqui estabelecer uma relação delicada com este tema e o meu trabalho em geral também é uma intervenção na janela penso que alguns dos vidros se devem ter partido com o tempo e os de cor laranja em acetato são feitos com tinta de raiz de dragoeiro e é uma forma também de barrar o espaço da livraria e trazer a luz sobre o livro, ou ao ler o livro têm outra aura. Também fiz uma seleção em volta de alguns elementos que já estavam cá, a ideia era criar aqui um espaço intimista e delicado no meio desta quantidade de livros todos com capa diferentes, a capa do meu também é branco por causa disso, com essa retórica de imagens para cativar o olhar”.

Quanto tempo foi dispensado aqui para esta instalação?
DL:. É um bocado difícil dizer um tempo exato, houve o tempo entre pensar e estar aqui, mas todos os meus livros são feitos também a mão e uma parte pertence a uma edição de 50 exemplares. Esta intervenção foi feita recentemente é um material que também uso na peça da rua do Conde Canavial em tecido e este sangue de dragoeiro foi uma grande ajuda da Cecília Vieira da Porta 33 que o conseguiu arranjar, na verdade é uma matéria muito simbólica na Madeira porque as primeiras indústrias que vieram para cá faziam tecidos que se exportavam para à Europa e eram muito caros.

 

Na Rua do Bispo, 21, na Capela de São Luís, surge logo à entrada o trabalho de Daniel Melim, um cenário que elucida “é para uma performance que vamos realizar, eu e a Mariana Camacha, onde vamos interpretar uma versão de um poema de Herberto Hélder, uma canção do Max e uma mourisca do Campanário e é um tema remisturado com as nossas próprias versões”.

De onde provém o imobiliário?
DM: É um armário que estava no atelier de uma amiga restauradora, que foi restaurado para poder estar no museu e que invoca um altar.
E a estátua?
DM: O que te parece?
YV: Não parece uma imagem religiosa como as que se veem nas igrejas, mas sim uma estatua com uma aparência mais étnica, de uma mulher do campo.
DM: É isso, uma escultura de madeira muito antiga, a ideia foi criar uma espécie de oratório.

Numa outra pequena divisão, as obras pictóricas de Alexandra Aguiar podem ser aprecidas, a artista plástica vive em Nova York. De acordo com as suas palavras,"Trata-se de uma colaboração. O desenho tríptico foi feito em 2008, e encontrava-se no acervo da Porta 33 até Miguel von Haffe, no seguimento desta iniciativa, os reativar, colocando-os em vista na capela do Museu de Arte Sacra. Esta ação de Miguel von Haffe, abre portas novas para olhar este trabalho. Eu, por outro lado, tendo sido o veículo de criação deste desenho tríptico, sou também colocada numa posição renovada de ver. Penso nas pinturas e objetos guardados em acervo, em museus e galerias, longe da vista, desativados momentaneamente por estarem privados de um olhar; e que voltam, depois em novo contexto, a ter oportunidade de criação renovada, olhar/ver é tao ou mais criativo que o fazer. Acredito que todos os olhares e impressões, inspiradas por um objeto, ficam impregnados na sua superfície. O trabalho torna-se mais, fica carregado dessa história emocional, passa de uma posição passiva, a um estado de Ser ativo. Acho brilhante que o Miguel tenha escolhido a capela do museu de Arte Sacra para mostrar este trabalho, tendo em conta a presença do tríptico na história de arte religiosa. Os desenhos são expressões do meu subconsciente, uma espécie de destilação. Fazê-los é um jogo de invenção com o material que uso. Apesar de não ser um processo fácil, a surpresa que provoca, é um verdadeiro prazer, por manifestar algo que não vi antes e que também não entendo totalmente, e é também isto que me leva a voltar a fazer. Esta iniciativa é mais uma oportunidade de partilhar isso. Não sei se vai inspirar reflexão, ou prazer, mas se alguém que venha ver sentir algo, ótimo".

 

Na Praça do município, na torre da Câmara Municipal do Funchal, surge após muito esforço, no topo das escadas, o trabalho de Martinho Mendes “estas obras reúnem dois tópicos que venho abordando faz algum tempo. O mais antigo é uma abordagem à indústria do bordado Madeira e não apenas numa vertente do desenho, possui mais uma dimensão estética na evolução do desenho, também reflete o aspeto sociocultural das bordadeiras e isso interessa-me. Sabemos que esta profissão teve uma série de lutas sindicais, devido as suas condições de trabalho, é uma profissão árdua e mal paga e foi conquistando com o tempo condições para as bordadeiras, embora não deixasse de ser um trabalho mal pago e isto são apenas algumas considerações históricas de uma maneira geral. Depois, eu junto a esta abordagem uma outra exploração visual que tem a ver com a geofísica e as características fisiológicas da Madeira. As rochas, os penedos, a ideia do “Risco”, das levadas, que tem sido a minha abordagem artística desde 2003 até hoje. Criei esta instalação, nesta estrutura que tem a ver com a condição de ver navios, que existe nesta torre na Câmara Municipal do Funchal e no seu conjunto estas referência remetem-nos para a paisagem e uma representação da minha subjetividade deste conceito de onde temos uma vista de 360º graus, que nos remete para a montanha, o azul o mar e que nos convoca todos estes aspetos históricos de navegações, de aproximações de navios e onde naturalmente vemos a indústria do bordado esta aqui representada com uma série de casas antigas que foram adaptadas para fábricas. É uma instalação que nos reporta para diversas dimensões e é também um convite para ler à cidade com esta ideia de camadas, de fluxos e dinâmicas socioculturais.

 

A cor?
MM: É anil, esta instalação é constituída por duas partes principais, uma antecâmara e a estrutura propriamente dia nesta sala maior. No espaço ao lado, temos um exercício de deslocamento de algumas referencias que são estes desenhos de originais que fui visitando, investigando e fotografando e onde recolhia alguns desenhos dados pelos proprietários quando as fábricas estavam na iminência de fechar. Esta obra possui um painel com três desenhos de quadros de toalhas de mesa e sobreposto ao papel esta uma pintura de 1949 que não é da minha autoria e que também é uma deslocação, uma apropriação, é uma paisagem de Kikiden, que também foi dono de uma empresa de tapeçarias. Ao entrámos, na sala principal da torre, vemos um outro painel na parede, com um formato panorâmico e com vários desenhos originais que ainda tem a transferência do anil, é o gesto real de quem fazia o desenho e o passava para o papel e que tem as iniciais de lenços de bordado Madeira. Esse mesmo anil é usado na cobertura desta grande pedra, que tanto pode remeter para os pedregulhos da nossa paisagem, como o esforço do trabalho e também do peso desta indústria que é representada com a cor do pigmento de anil.

 

Na Praça Colombo, 5, no Museu do Açúcar, somos confrontados com um vídeo de Filipe Ferraz e Mariana Camacho, que segundo ela, “é muito claro, é uma critica, mais do que uma obra artística, é um trabalho antropológico sobre a sociedade em que vivemos desde que somos portugueses, ocidentais, explorámos povos e Portugal também foi um império colonialista. No caso especifico da Madeira continuámos a fingir, ou ignorarmos por completo que tivemos escravatura e o que tivemos partiu em parte da exploração de seres humanos. É também uma critica ao poder branco, a supremacia branca e que devemos dar voz a quem o merece.

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