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O insurrecto

Escrito por 

 

José Vieira Mendes assume-se como um escritor de literatura dramática e desde 2008 integra o Teatro Praga como artista residente e dramaturgo, mas a sua produção literária também inclui ensaios para teatro, libretos para óperas e tradutor.

Fala-me um pouco sobre o teu processo de escrita para o teatro. Nas tuas peças englobas todos os tipos de escrita que existem e acaba por ser difícil de levar à cena.
José Vieira Mendes: Eu não tenho um processo fixo. O que me interessa fazer é uma literatura dramática, sobretudo, os códigos que estou a usar, ou me estou a mexer são da literatura dramática, que tem uma história própria, tradições e autores que foi conhecendo ao longo dos tempos e estou com essa bagagem toda que conheço, estou a tentar ocupar o meu espaço nesses códigos. Não me preocupa de todo o espectáculo de teatro quando estou a escrever e quando escrevo é literatura e não um peça de teatro. É inevitável que seja influenciado pelo teatro, na medida que sou uma pessoa que trabalho em teatro, para além da literatura, mas tento distinguir esses dois momentos. Tanto sou influenciado pelo teatro, como pela vida em Lisboa, pelo telejornal, ou mesmo "a casa dos segredos", nesse ponto de vista não acho que haja uma relação privilegiada entre aquilo que escrevo e os espectáculos.

Não é uma contradição?
JVM: As peças que são levadas à cena é um problema que não me diz respeito até porque, idealmente para mim não gostava que esses textos fossem levados à cena nesse sentido, mas também não faço questão que não o sejam. Os textos estão disponíveis e interessa-me publicados e se por acaso alguém quiser fazer um espectáculo que os faça e se for uma pessoa com dinheiro ainda melhor, porque ainda recebo, porque é o único interesse que tenho em relação aos meus textos e o teatro. Não acho que o texto necessite de um espectáculo.

Então como te defines, quando se faz uma pesquisa com o teu nome apareces como dramaturgo.
JVM: Eu defino-me como dramaturgo e foi isso que acabei de explicar. É uma pessoa que escreve literatura dramática que estão inseridos nessa tradição, um autor de literatura dramática tem uma relação diferente com o teatro, porque os seus textos só estão completos se forem postos em cena, há autores que acham que sabem o que é o teatro e escrevem para ele. Como não tenho nenhum desses conhecimento, como não sei o que é o teatro e como aquilo que estou a tentar descobrir o que é a literatura dramática e o pode ser o meu texto, não tenho qualquer interesse entre essa relação entre o texto e o teatro.

Então não te preocupas com o feedback do público?
JVM: Eu preocupo-me com o feedback dos leitores. Eu quero que os meus textos sejam publicados e lidos. Essa é a relação privilegiada, que interessa ter com o leitor. Os meus textos não tem uma relação com o espectador, o espectáculo é que o tem. O meu texto é letras em papel e a relação passa a ser com o leitor e não o espectador. A ideia de que texto é teatro é errada, texto é texto, depois há pessoas que dizem: vou fazer um espectáculo a partir deste texto, ou vou adaptar este texto, mas isso é na cabeça deles, as pessoas que vão ver esse espectáculo por sua vez, não o vêem esse texto, estão a ver a obra. A relação directa que posso ter com o público, é mais uma relação com o leitor e não com o espectador.

 

 

Na tua escrita tu procuras o sublime?
JVM: Isso foi o André Teodósio que disse, aliás, que é um ponto em que o teatro Praga gosta de trabalhar é equivalente aquela ideia de que estamos num sítio em que se dermos um passo em frente caímos e morremos e se em contrapartida dermos um passo para atrás deixámos de ver aquilo que estamos a ver, é um ponto dentro e fora de uma realidade, estamos por um lado dentro das convenções e por outro renovamo-las. Mas, ao faze-lo, estamos a ser comidos pelas próprias convenções. E desse ponto de vista considero também que quando estou a trabalhar em literatura dramática, quando estou a escrever, estou por um lado a seguir os seus códigos com tudo o que já li e consciente do que é texto de teatro e toda a história desde Aristóteles até os dias hoje, mas tenho essa bagagem, mas para além disso, vou tentar encontrar novas coisas sabendo contudo, que não há novidade ao mesmo tempo. Nós achámos que é novo e não é novo, esta ideia de contradição permanente, mas não é contraditória, porque não é dual, não é um sim ou não, há muitas coisas ao mesmo tempo.

Como dramaturgo como achas que o país olha para pessoas como tu?
JVM: Não faço ideia. Acho primeiro que não deve estar muito interessado. Mas, as pessoas que olham, traz a sua forma de olhar e eu não posso controlar isso, posso tentar conversar e agora o que estas a ouvir é de certeza diferente do que estou a dizer e portanto, será sempre assim, a comunicação é isso mesmo.

Fala-se que não existe um público para teatro, como disseste não escreves para o teatro, mas achas que ele existe ou não?
JVM: Como disse interessa-me que haja leitores e não público, enquanto escritor. Como pessoa que faz espectáculos com o teatro Praga interessa-me que haja público. Eu não sei se há ou não, eu sei que existe, porque há pessoas a ir aos espectáculos e quem profere essa afirmação tem essa ideia de que devia haver mais, ou há pouco. Em geral, consultei umas estatísticas da união europeia e de facto em Portugal a quantidade de população que usufrui de eventos culturais é muito reduzido e idealmente gostaria que houvesse mais gente. Mas, acho que não devíamos responsabilizar só o público, ou o leitor, mas também os artistas. Há sempre a ideia de que os artistas queixam-se, mas se calhar também tem de pensar, porque que é que as pessoas não vêem. E não é só por causa da televisão, é também porque os espectáculos são uma seca, nós, teatro praga, também pensámos nisso. Não tentámos responsabilizar a falta de público a uma sociedade mediática que já não esta interessada na cultura e que as pessoas são todas burras. Existem pessoas burras, mas nós também podemos ser burros, temos que fazer sempre uma autocrítica.

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