A conversa musical prossegue num ritmo distinto, inspirado na selva, sou transportada para a terra-mãe, o piano, o contrabaixo e a bateria imitam os sons do útero mais profundo de gaia, consigo ouvir os ronronar da floresta, das águas a correr apressadamente pelos ribeiros, de asas a bater em fuga e inesperadamente o som de uma flauta indígena embala os sentidos, “healing the mother earth”, em português curando a terra-mãe, transita de um som quase tribal para uma sonoridade mais sofisticada que se dilui na distância, permitindo que cada músico encontre a sua voz, um deles é Jorge Maggiore, que afirma, “ gostei da música, identifico-me com ela, tive alguma dificuldade técnica em dois temas em termos de compassos irregulares, mas estou a apreciar bastante esta experiência”. Quando confrontado com as pautas, o baterista refere, “não é muito a questão da originalidade, é mais de um espirito que é cativante”. Daí o repto deste projecto musical inusitado, “há partes que são bastantes determinadas, temos de respeitar a escrita e outras muito abertas em que temos de usar mais a intuição, é necessária muita comunicação entre nós. O desafio aqui foi manter o interesse na proporção certa em momentos muito abertos, em que tudo pode ser possível. É conseguir seguir uma linha narrativa interessante, para quem ouve e para quem toca, se for um tema de vinte minutos tem de ser interessante durante esse período de tempo, se assim não for não vale a pena continuar”. Duarte Nuno, o pianista também frisa, “é mais uma experiência, eu só concordei em faze-la, porque achei interessante”.
Nova paragem, entre um café e um cigarro, outro tema inquietante ganha vida nova, o “seaside tango”. É mais uma barreira musical que se dissolve através de pequenas anotações pessoais, de curtas conversas entre determinados trechos que são repetidos uma e outra vez até a exaustão, até satisfazer os ouvidos e acalmar os espíritos mais exigentes. Cada um dos músicos procura domesticar as notas ao seu bel-prazer, Taka, tiki, tiki, taka, taka, taka, repetem para si próprios, mnemónicas sonoras que transformam em música improvisada que surge inesperadamente, é uma melodia segue um determinado alinhamento, mas que passado pouco tempo ganha uma personalidade distinta, os músicos dialogam entre si através de notas musicais e cada um faz ecoar a sua voz através do instrumento que toca. Trata-se de uma sonoridade mais quente, mais latina, Ricardo dias, o contrabaixo, explica, “é música que tem uma identidade, eu acho que as raízes argentinas estão muito presentes. Nos dias de hoje isso é muito mais importante que a música em si. No fundo como tem raízes tradicionais, ou de música do mundo, as dificuldades surgem porque é necessário entrar nesse tipo de linguagem. Com a globalização as barreiras são mais curtas, basta ver, estamos numa ilha com alguns metros quadrados e temos um homem que vive em Nova Iorque e que vem tocar numa ilhota. O mundo é um T0, essa proximidade, esse contraste com outros músicos a viverem mesmo ao lado e virem mostrar a sua música ao qual não estamos habituados é maravilhoso”. A experiência no jazz também ajuda continua, “é um processo e quando é bem feito temos uma comunicação extrema e é isso que se pretende com ele. Não no sentido radical, mas de proximidade e o jazz é isso. Tudo isso está presente na sua música, apesar de ter essa característica tradicional com esses ritmos dito latinos, há espaço para a improvisação”. E é deste modo, quase ao improviso que termina esta conversa musical, até o próximo ensaio.