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A paisagista cultural

Escrito por 

 

Gabriela Albergaria é uma artista plástica portuguesa que vive e trabalha em Nova Iorque e que define a sua obra como a ideia de reconstrução de momentos, sejam observados ou a partir de mecanismos do sentir. A ideia de um local físico que desperta o desejo de executar uma determinada peça e a paisagem no sentido cultural, não a paisagem "selvagem".

Segundo as suas próprias palavras, a sua obra reflecte um entorno social, político e cultural, onde é que se encaixam essas vertentes em peças de arte relacionadas com a natureza?
Gabriela Albergaria: O que acontece é que de qualquer lugar que eu parto é um lugar físico e real. Ele é sempre um conjunto de coisas que são o domínio da cultura, do social e do político. O me interessa num lugar é perceber como o leio, qual é a sua história, se esta relacionado com o contemporâneo, que decisões foram tomadas para ser daquela determinada maneira e quais são os pontos que me podem interessar ali. É nesse sentido. É um confronto connosco e nós somos seres sociais e políticos.


A paisagem nas suas peças são descontextualizadas, como no caso da árvore, porque decide sempre reinterpreta-las?
GA: Não, é sempre assim. Talvez tenha sido o que eu escolhi para apresentar aqui, porque o tema era "o lugar e a representação". Do lugar parto de uma coisa real e as peças fazem isso, a árvore aparece por um acaso, não tenho nenhuma razão específica, há um fascínio de se ir conhecendo, foram as circunstâncias e as visitas que foi fazendo a vários jardins. Tudo foi acontecendo naturalmente no trabalho. A questão de descontextualizar, é que eu gosto muitas vezes de encontrar soluções que já estão feitas na natureza e como esta bem feito posso aportar para mim aquelas coisas que já existem para chamar à atenção para determinados pontos que me interessam. É um produto do meu trabalho. Interessa-me mais executar uma coisa nova sobre um determinado tema.


Algumas das obras chegam a ser muito violentas.
GA: Exactamente. Quando vê essas árvores elas assumem um momento poético, depois são extremamente violentas, porque são feitas com encaixes, se calhar obedecem a uma linguagem da escultura. Quando coloco um ramo ele não pode cair, tenho de encontrar uma forma de o agarrar, então encontrei esta linguagem que vem dos jardins, das cercas e das pontes. Tudo são soluções que encontro na maneira de trabalhar a natureza. É uma linguagem violenta, porque esta dentro de um museu, de uma sala, nós olharmos para ela de outra maneira. Se visse uma árvore na natureza a ser escoriada com uma madeira que tem um parafuso para se segurar, não dizia a mesma coisa. A minha função é sempre encontrada na natureza.


Visitou vários jardins, em diversos pontos do mundo. Porquê?
GA: Os jardins, mas não só, as paisagens, locais naturais, interessa-me. Andar pela natureza, com os pés na terra. É o que eu gosto.


Como é que chega até aquela árvore, aquele local, aquela determinada paisagem que lhe interessa?
GA: Isso são eleições, que não são só uma. Eu vou ver um jardim, uma paisagem. Quando fiz, com o Nuno Henrique, a levada do rei, eu sei que alguma coisa vai transformar-se em trabalho, porque se escorrega, porque foi difícil, tem árvores incríveis, porque ele sabia o nome de todas as espécies endémicas e introduzidas e tive essa espécie de introdução ao longo do caminho. Quando levar este material todo para o atelier e começar a olhar para ele, para as fotografias, escrever aquilo que vi e começar a lembrar-me daquilo que assisti com certeza que alguma coisa vai acontecer, porque vou querer fazer um trabalho sobre isso. Agora, eu não consigo dizer exactamente como. Eu sei que naquela peça o ulmeiro, disse que gostava de fazer a escultura de uma árvore, mas queria encontrar uma espécie que fosse interessante, uma história. Estivemos a trabalhar quase um ano em Lisboa à procura de qualquer coisa em torno das árvores até que encontraram um ulmeiro, é uma espécie que esta em extinção na Europa, porque tem uma doença e este era o último na Avenida das Descobertas, é mesmo ao lado do CCB, faz parte de todo aquele plano de urbanização e achei que era interessante. Tinha uma dimensão de que gostava, que os braços podiam abarcar, sem ser muito pequena, ou muito grande. Havia mais ou menos uma relação corporal e eu achei que podia fazer alguma coisa com isso. A outra árvore de Vancouver foi um bocadinho a mesma coisa, achei interessante que uma árvore, num país que é conhecido com o mais natural do mundo, despoluído, que essa árvore morresse de stress. Foi trazida de outra costa por habitantes que tinham nostalgia dessa espécie. Essas histórias para mim são importantes.


Agora esta a visitar os parques naturais dos EUA e referiu que há uma diferença que se coloca em relação à Europa que é questão da dimensão.
GA: Nós já não temos espaço, porque está tudo construído, ou então esta transformado pela agricultura, não temos bem a noção da extensão de um local selvagem. A extensão dum rio que vem directamente da montanha e que nada toca, não temos isso na Europa. Então, estou a ter novos contactos com a natureza que não tinha.


Ao longo do seu percurso profissional e artístico sempre desenvolveu várias componentes, desde a fotografia, o desenho e a escultura?
GA: Foi acontecendo. Primeiro estudei pintura tradicional, deixei de pintar e comecei a fazer mais fotografia, depois escultura e misturei o desenho. Sempre desenhei só que não o misturava como produto final, era entendido como processo e há uma altura em que tudo de junta e que vem com a maturidade do trabalho. Vai crescendo e vai fazendo sentido misturar as duas coisas no meu caso.

www.gabrielaalbergaria.com

 

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