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O cineasta que veio do frio

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Francisco Manuel Sousa é um jovem realizador com um pequeno curriculum que marca já a diferença, pelo olhar irónico, mordaz e muito criativo visível nas suas curtas-metragens. Um nome a reter em termos de cinema nacional.

Quando soubestes que querias fazer filmes e ser realizador?

Francisco Manuel Sousa: Quando era mais pequeno queria seguir arquitectura, sempre tive uma paixão pelas artes, mas quando cheguei ao secundário e comecei a fazer trabalhos muito próximos dessa área percebi que não era não era isso que queria para o meu futuro. Nessa altura, comecei a ver por conselho dos pais mais filmes de autor, cinema europeu e apercebi-me que era isso que eu queria fazer, queria contar histórias. Achei que era um mundo interessante no qual queria entrar.

Há um filme em particular ou realizador que motivou essa mudança?

FMS: Houve vários, quando vi o “Blow-up” do Michelangelo Antonioni, o “Bufalo 66” de Vicente Galo, foram esses os filmes que me marcaram, identifiquei-me com a linguagem, que entendia e que queria desenvolver através de histórias minhas.

Vamos falar agora dos teus projectos cinematográficos, da tua curta-metragem mais antiga, uma “última ceia” muito sui generis, o objectivo foi chocar, ou não?

FMS: Não, (risos). Foi o exercício para uma cadeira de imagem e som na universidade e tinha umas regras muito específicas quanto à sonoridade e ao tipo de iluminação. Podíamos tê-la feito sem uma narrativa, ou sem diálogos, podia ter tido cenas desconexas desde que respeitássemos essas regras, mas decidimos que era mais interessante contar uma história, juntámo-nos numa noite e começaram a surgir umas ideias meias malucas que pareceram na altura ter sentido, não foi com o intuito de chocar, foi só uma maneira de fazer o exercício, haver uma narrativa e divertir-nos.

Como é que surgiu a ideia de “últimos dias”?

FMS: A ideia surgiu ainda antes de entrar na universidade. Quando cheguei ao fim tive de apresentar um projecto que me ia dar a nota do curso e lembrei-me dessa ideia, vi que era boa para desenvolver, com coisas que tinha aprendido, filmes que tinha visto na UBI (Universidade da Beira Interior), trabalhos que tinha desenvolvido sobre o realizador Michael Haneke e vi que tinha uma linguagem que se ligava aquela história, depois foi pensa-la outra vez, quais os caminhos que podia seguir. Não me lembro de onde a ideia surgiu, talvez com “Elephant” de Gus Van Sant, ou com filmes que tinham a ver com uma adolescência depressiva e com tendências violentas.

Como é que fizestes o casting para a actriz principal?

FMS: Fizemos dois castings um em Castelo Branco onde vivo e outro na Covilhã. Foram em escolas com alunas da idade da personagem, logo na primeira apareceu a Joana, e não sei bem explicar, mas ela fez muito bem o casting. Ficámos surpreendidos. Ela faz parte de um grupo amador de teatro, por isso, já tinha alguma experiência em termos de representação. Na Covilhã, por exemplo, as raparigas que aparecerem não tinham qualquer experiência em termos de teatro amador. A joana como disse, surpreende-nos logo, para já, porque fisicamente era o que queríamos e depois ela conseguiu captar a personagem, depois teve uns ensaios para entrar nos seus caminhos mais violentos, mas sempre conseguiu tudo de uma maneira muito natural e evoluiu bem sem muitos problemas.

Surpreendeu-te o sucesso de “últimos dias” ao ser selecionado para vários festivais e ter colhido alguns prémios ao longo desse percurso?

FMS: Surpreender não me surpreendeu. Eu enviei os filmes para os festivais com a esperança que fossem selecionados, mas também enviei para muitos outros onde não foi selecionado. Deixou-me muito feliz que tivesse passado de norte a sul do país e até nos Açores. Mais surpreendido fiquei com a reação das pessoas quando coloquei o filme na internet, tenho tido um feedback bastante positivo de estrangeiros.

Mas nem sequer tinha legendas.

FMS: Pelo facto de ter recebido comentários de alguns brasileiros e não pensei que uma história bastante fria lhes fosse apelativa.

Ficaste admirado, porque por norma não perceberem o nosso português?

FMS: Sim isso também, porque o português era diferente.

Fala-me do “Cool” e como surge neste teu curto trajecto como cineasta.

FMS: O “cool” surgiu de um suceder de acasos felizes. Na altura tinha acabado o curso, não tinha trabalho, nem nenhum projecto para desenvolver e dois amigos que eram finalistas de outra escola também em Castelo Branco pediram-me ajuda para desenvolver um conceito. Andámos a ver histórias, tivemos várias reuniões para desenvolver ideias para um filme sem muitos meios, nem actores, porque se na Covilhã tinha sido difícil e havia algum apoio, em Castelo Branco não tínhamos apoio nenhum. Descobrimos então um livro de contos de um autor local, que era muito cinematográfico, sobre heróis de acção e foi uma questão de falar com o escritor para obter a autorização, depois foi criar um guião e ao princípio eu que só os queria ajudar, vi-me envolvido num projecto que não era meu, que escrevi, realizei e produzi que era o “cool”.

Tanto em “cool” como em “últimos dias” há actores consagrados do panorama português, como é que consegues que eles embarquem nestas tuas aventuras?

FMS: A maior parte deles estão muito dispostos a ajudar quem esta a começar. O mais difícil talvez é o obter os contactos, mas eu tive esse trabalho facilitado, porque os consegui através dos meus professores da UBI. Depois de contactados os actores, desde que não tenham nenhum trabalho em mão, são muito acessíveis, mesmo quando não recebem qualquer tipo de cachet. Às vezes é uma questão de procurar e falar com as pessoas, explicar de que se trata o projecto e suas condicionantes. A maior parte acaba por aceitar.

Acabado de sair da universidade como vês o panorama nacional para jovens cineastas como tu?

FMS: É difícil, é preciso arriscar com pouco material e tentar mostrar esses trabalhos em alguns festivais. Para obter um financiamento é preciso estar ligado a uma produtora. Depois de chegar até lá com um guião é preciso convence-los para apresenta-lo como um filme deles e isso é algo para o que não nos preparam, (falo por mim), na universidade. É um mundo muito fechado, nem sequer fazem castings para técnicos. O que resta é fazer trabalhos independentes e aparecer em festivais. É sempre bom ir criando o nosso nome, mas é difícil faze-lo profissionalmente.

E haver uma instituição ligada ao cinema, o instituto de cinema e audiovisual (ICA) ajuda ou no teu caso é completamente indiferente?

FMS: É-me completamente indiferente, porque para conseguir obter dessa instituição algum apoio é preciso ter alguma experiência ao nível profissional, ora se não me ajudam obtê-la acaba por ser indiferente. No geral em termos de cinema acho que também o dinheiro que tem disponível para apoiar é muito pouco, pouco mais de cinco longa-metragens nacionais, acho que é preciso fazer algo mais.

A única saída para jovens como tu é fazer curtas-metragens.

FMS: Sim pequenas curtas, pequenas participações que ajudam a criarmos um curriculum, um portfólio. Actualmente, há uma nova produtora na Covilhã que esta a tentar obter apoios do ICA, estou a escrever um guião que pretendo submeter para ver se consigo alguma coisa. Mas, sim acho que passa por aí, por não estarmos parados e fazer trabalhos por mais pequenos que sejam, porque aprendemos e ao mesmo tempo mostrámos qualquer coisa nossa.

http://vimeo.com/franciscomanuelsousa

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