JPC: Houve um aumento.
Mas, motivado por causas exteriores ou não?
JPC: Há um aumento devido à incapacidade das pessoas que andam perturbadas de emocionalmente resolverem os problemas.
Não derivado à crise.
JPC: Relacionado com à crise, porque tem muita gente em crise que não se mata a si próprio, nem mata ninguém. Não é um fenómeno impar que é circunscrito apenas aos portugueses, em qualquer parte do mundo isso é normal e tem acontecido assim.
Este ano, ao fim de seis meses, 23 mulheres foram assassinadas por causa da violência domestica.
JPC: Isso é um problema que poderá ser agravado pela crise, mas não me parece que seja, porque anteriormente havia uma tendência mais ou menos estabilizada com esse número. É evidente que 23 nesta ocasião já é muito, porque se houve anos em que aconteceram 21 casos e actualmente temos este número e ainda não acabou o ano, estamos ao meio, se tudo se mantiver em termos de progressão estatística haverá muito mais mulheres mortas.
É um tipo de crime que é mais violento em relação a anos anteriores ou não?
JPC: Eu acho que sim. Há maior número de casos, o problema é que não se fala muito disso, porque só existe crime depois de a pessoa ter sido condenada. Antes de ser julgado o individuo é presumivelmente inocente, pelo que os números oficiais deste tipo que a comunicação social relata são obtidos por conhecimento directo, muitos deles não constam desses dados estatísticos, porque as pessoas não foram condenadas, nem julgadas. Mas, daqui a dois ou três anos quando todos forem a julgamento, vamos verificar que os números são muito superiores daquilo que actualmente se veicula pela comunicação social.
É também um tipo de violência que se verifica mais nos países latinos ou não?
JPC: A maneira emocional de resolver os problemas também esta relacionada com a nossa índole, mas agravada pela crise. Se for comparar os números de homicídio de há 10, ou 15 anos eram muito inferiores daqueles que ocorrem agora.
Afirmou mais do que uma vez que não existem autópsias inconclusivas, mesmos estas requerem mais tempo, mas consegue-se chegar a uma conclusão.
JPC: O que eu disse e repito é que se lançar mão de todas as potencialidades da investigação criminal ao nível de autópsias practicamente não haverá relatórios inconclusivos. A maior parte ocorre, porque não feito o que poderia ter sido feito. Uma autópsia ou outra inconclusiva é perfeitamente possível, se eu envenenar uma pessoa com um veneno que só eu conheço, ou que inventei e não há possibilidade de diagnóstico, depois de apurar todas as análises laboratoriais o resultado é negativo. Portanto, a autópsia tem um resultado inconclusivo, mas é um caso excepcional. Em regra quando se fala de autópsia inconclusiva é porque não se entendeu tudo o que se deveria fazer. Eu costumo dar o exemplo de quando esta uma sala cheia e pergunto: quantas pessoas estão aqui? Ninguém sabe, é uma resposta inconclusiva, mas se antes contar todas as pessoas que lá estão, será conclusiva.
Então é possível obter um óbito em medicina legal sem ter um corpo, baseado nos indícios que restam?
PPC: Sim, quer dizer, há essa possibilidade em determinados casos, por uma razão, porque a medicina legal não é só o cortar do corpo. O cortar do cadáver é a terceira parte de uma autópsia de medicina legal. Há quatro partes, sendo que a primeira é informação. O que é essa informação? É o que se diz, o que consta, o que a comunicação social relata, os boatos que correm, tudo isso tem de ser analisado cientificamente. Depois vamos ter a segunda parte que consiste no exame local, o cenário do crime, de todos os vestígios, toda substancia material que possa traduzir gestos, ou atitudes de comportamento de determinadas pessoas. Dizia Edmund Plockard, parafraseando o professor Alexandre Lacasand, porque foi ele o autor da frase, que um exame do local bem feito representava ¾ partes da autópsia médico-legal. Directamente relacionada com a sua questão esta aqui a sua resposta. Se ¾ partes da autópsia está practicamente feita em grande parte, depois ainda temos a acrescentar a informação. E só pela informação vou-lhe resolver um caso em segundos, por exemplo, a informação que tenho é que a Rosinha matou o filho, averigua-se que ela não teve filhos e o caso está resolvido só com esse dado. A terceira parte muitas vezes é só para confirmar ou não, aquilo que tínhamos apurado com os vestígios no local. Depois de cortado o cadáver, não é só o corpo propriamente dito que interessa, é também o que tem vestido e nu por fora e por dentro. O aspecto da pele é fundamental, fornece imensas informações, internamente também observam-se os órgãos, mas na pele se encontrámos um orifício, no caso de um tiro, se uma pessoa estivesse vestida, todas as provas de deflagração da pólvora do tiro estão no vestuário. Acabou a autópsia médico-legal? De maneira nenhuma, eu disse que são 4 partes. A quarta consiste em exames complementares e laboratoriais sem limites e beneficiando de toda a tecnologia das mais diversas ciências, da física, da química, informática e estatística. Se atendermos com a maior profundidade à análise do ponto um, dois, três e quatro practicamente não pode ser possível haver autópsias inconclusivas, mas é necessário fazer tudo isto.
Em relação aos técnicos e médicos de medicina legal, graças a estas séries de televisão como o CSI tem notado uma maior apetência pelo curso ou não?
PPC: Sem dúvida. Todas as pessoas que procuram cursos relacionados com a medicina legal foram muito motivadas pelo CSI, Ossos e ainda outras séries desse género. A ciência é mais conhecida e mais pormenorizada e as pessoas tem a ideia que tudo é tão fácil como aparece ali na televisão, mas não é. Os programas são muito interessantes, apesar de todas as incongruências que lá existem, e a primeira é quando vemos a investigadora bem penteada e maquilhada, sem pó, e o mesmo se diz ao investigador, com colarinhos impecáveis e bem vestidos, mas sei que tem de ser assim, se visse uma actriz toda desgrenhada e porca, eu mudava logo de canal e não é isso que interessa, o que interessa é que continuemos presos ao ecrã, Outro aspecto curioso é que ainda não existiu o crime já esta tudo preparado para resolve-lo, trata-se de uma série televisiva, aquilo não é tudo realidade, é ficção, embora os primeiros episódios tenham sido baseados em casos reais.
Então continuam a aparecer nos cursos por causa das séries.
PPC: Sim, eu sou professor de criminologia, medicina legal, psicologia forense e toxicologia e normalmente quando se pergunta aos alunos porquê vieram para este curso, por norma respondem, por causa do CSI e depois é preciso chama-los à realidade. As séries como esta são importantes na medida em que nos obrigam a caminhar para o impossível, mas antes temos que passar pelos degraus do que é possível e digo isto, contra muitos outros colegas que consideram estas séries como algo prejudicial. Eu não, acho que é muito positivo.
Em termos profissionais, houve um ou mais casos que constituíram um desafio?
PPC: Ora bem, os casos mais difíceis são sempre os mais fáceis e vice-versa.
Em que medida?
PPC: Quando á priori temos um caso difícil há a tendência de fazer tudo o que é possível e impossível, mas se o caso for aparentemente fácil pode-se não fazer. O melhor é fazer como eu, considerar todos os casos difíceis, porque assim não escapa, não foge.





