Não, ninguém diria.
NM: Também gosto, mas necessito de uma peça mais densa, de criar uma personagem mais pesada. Preciso mesmo disso e quando a “com.tema” nasce a primeira peça nem é uma comédia, contingências várias levaram-me por esse rumo, até por uma questão de sobrevivência, porque é mais fácil atrair público para uma sala de espectáculos com comédia do que um drama, pelo menos há mais audiência. Ao fim destes dez anos de “com.tema” nunca fiz um stand-up comedy sozinho, embora sejamos identificados com isso. Sou uma pessoa demorada, só faço as coisas quando estou preparado para as fazer. Neste momento estou a encerrar o ciclo dos “ridículos” no cine max. No final do ano pretendo estrear pela primeira vez, o Nuno Morna em registo a solo de stand up comedy, numa primeira parte, mas não só.
Fazendo um períplo por todos estes espectáculos de stand up comedy o que distingue os “ridículos 3” dos restantes registos?
NM: Na “com.tema” temos 3 registos diferentes de peças de teatro, primeiro foi a estrutura do “vou-te bater” que eram um conjunto de sketches separados, mas que tinham às vezes algumas ligações aqui e ali. Criámos as “rapidinha do Funchal”, numa perspectiva de humor, contámos a história da cidade desde os seus primórdios, do século XV até a actualidade e tivemos a “rapidinha da crise” que foi a coisa mais difícil que fizemos até hoje em termos de textos, porque ninguém percebia nada de economia, zero, tivemos de entender tudo para poder desmontar toda aquela linguagem e encontrar o registo certo para faze-lo com humor. Depois há os “ridículos” que não foi criado por nós, mas os textos são do Filipe Sousa e que no fundo são duas personagens a falar das figuras ridículas que vemos todos os dias e de como não nos apercebemos o quanto ridículos somos.
Uma das dificuldades de que se fala é da falta de autores. Isso deve-se ao facto de não conseguirem escrever textos para um palco e a dificuldade que sentem em perceber essa dinâmica?
NM: Sim, mas por isso tenho o cuidado de dizer as pessoas que ninguém nasce ensinado. Uma das coisas mais difíceis de fazer é a dramaturgia de um texto, eu posso escrever uma peça para teatro, posso entrega-la a um encenador e ele olhar para aquilo e dizer, eu gosto muito disto, mas precisa de dramaturgia, porque não esta feita. Há essa falta de noção do palco para quem escreve. Aos textos do Filipe Sousa passava-lhe a dramaturgia toda ao lado, entre nós, na companhia, eu, os assistentes e os actores que a criámos, por isso considero que isso seja um falso argumento.
É difícil encontrar autores em Portugal?
NM: É difícil, porque as pessoas têm medo. Há uns que escrevem, mas acredito que tem receio de os mostrar. Por exemplo, o Filipe Sousa, eu sabia que tinha escrito algumas coisas, andei uns sete ou oito anos atrás dele até ler o primeiro texto. Este ano fizemos uma peça que eram “as conversas da Maria Joana”, da Joana Andrade aí foi ela que se propôs escrever um texto para ver o que eu achava da sua escrita, eu pensei que tinha potencial para ser desenvolvido com umas dicas e nasceu esse espectáculo. Há gente e andámos a procurar de pessoas com textos até para recuar nas fórmulas que vamos mostrando ao nosso público.
Qual é o teu próximo trabalho, exceptuando a stand-up a solo?
NM: É um texto do Ionescu, uma adaptação do Macbeth de William Shakespeare, tem doze personagens, uma série de actores e muita acção no palco. É um texto absurdo e penso que o Ionescu decidiu agarrar um texto emblemático e restructura-lo. Em príncipio em finais do próximo ano vamos ter essa peça em palco, se daqui até lá conseguimos obter os meios financeiros para o montar, porque se trata de uma peça cara. São onze personagens com oito actores em palco, vou encena-la em parceria com o José Júlio Castro Fernandes que fez a tradução do texto de francês para português e a cenografia.
Apostar numa peça de teatro neste período tão crítico não é quase suicídio, num país onde não há uma visão cultural?
NM: Eu diria que as pessoas atentas à cultura apercebem-se que pontualmente houve em Portugal alguém que esteve à altura das estruturas dirigentes e falo da secretaria de estado da Cultura, ou ministério da cultura em momentos diferentes, falo de Pedro Santana Lopes e o Manuel Maria Carrilho, bem ou mal, concorde-se ou não, e não pretendo discutir essa questão, eles tinham um projecto que mais ninguém teve. Tenho muita dificuldade em aceitar que haja pessoas que aceitam o cargo sabendo de antemão que não vão fazer nada, porque não tem meios para o fazer.
E ao nível regional?
NM: Igual, a mesma coisa. Não há diferença, não há política cultural na Madeira.
Acha que se confunde cultura com entretenimento?
NM: Completamente, embora uma coisa não possa ser dissociada da outra, tudo tem o seu lugar, entender que a cultura são os ranchos folclóricos e as bandas municipais é redutor, há mais para além disso. Se não temos mecânicas de fruição e não temos público para os fruir, a culpa não só é a falta de uma dinâmica credível, mas também de quem tem responsabilidades políticas de criar ao nível das infra-estructuras e da formação no público esses mecanismos para que as coisas se desenvolvam. Mas, isso não interessa, porque quanto mais uma pessoa for culta, mais tem capacidade para pensar e não interessa aos políticos que as pessoas se questionem muito, porque essas são perigosas.