Agora gostaria de abordar a sua actividade como dramaturgo. Como é que uma pessoa decide escrever para teatro como profissão?
JP: Acho que tem de haver dois interesses muito fortes que é o interesse da escrita e do teatro.
É difícil ser dramaturgo em Portugal?
JP: Sim, porque não existe para já uma estrutura forte que promova a dramaturgia em Portugal, não existe uma grande aderência do público ao teatro, nem massa critica e ainda, há um número limitado de publicações para teatro na língua portuguesa.
No entanto, em muitas das entrevista que realizei a artistas e encenadores todos são quase unânimes em afirmar que há falta de dramaturgos no país.
JP: Eu não tenho essa percepção pessoalmente. Basta fazer uma pequena pesquisa no Google para encontrar nomes de diversos dramaturgos a trabalhar. O que acontece é que o trabalho dos dramaturgos é bastante restricto, tem impacto na área de actuação na companhia onde costumam trabalhar e pouco mais, ou seja, se houver autores a trabalhar em Lisboa o seu impacto será mais nacional, se estiverem sediados no Porto, em Coimbra, na Beira interior, em Trás-os-Montes, ou mesmo nos Açores e na Madeira o seu reconhecimento será muito mais regional. Para isto contribui o facto de não haver uma política sustentada de publicações de teatro, pelo menos peças em português.
Também não se deve ao facto das companhias de teatro não estarem sensibilizadas para terem um dramaturgo a trabalhar com eles?
JP: Sim, de facto não existe. Por um lado, em termos comerciais acaba por ser mais eficaz trabalhar com textos consagrados, porque os autores já tem notoriedade, são conhecidos e isso atrai público à partida. Enquanto, começar com um dramaturgo mais ou menos desconhecido que trabalhe para essa companhia é um trabalho mais a longo-prazo, exige um maior investimento e a maior parte dos grupos de teatro em Portugal não se pode dar ao luxo de fazer essa aposta.
Mesmo quando um dramaturgo é premiado como é o seu caso?
JP: Sim.
Abordando algumas das peças de teatro que escreveu, "o auto da razão", de 2003, foi galardoado com o prémio Miguel Rovisco, fale-me um pouco dessa obra.
JP: Essa foi uma das minhas primeiras peças para teatro, foi levada à cena por quatro companhias diferentes, uma em Guimarães, no Porto, em Leiria e Lisboa. A peça é sobre o absurdo, uma busca de identidade, já que, o protagonista comete um crime e procura fazer sentido num mundo que deixa de fazer sentido.
Depois escreveu o "antes da meia-noite", de 2007, galardoado com o prémio Manuel Deniz- Jacinto, é uma peça com muitos personagens.
JP: É sobre um conjunto de amigos que se reúne para festejar a passagem de ano, sendo que a maior parte deles estão no final das suas vidas universitárias e estão a preparar-se para entrar no mercado de trabalho. A peça retrata muitas dessas angústias da transição. De certa forma vai começar a haver caminhos individuais para cada um deles e vão perder o contacto entre si.
É autobiográfico de certa forma?
JP: É autobiográfico no sentido em que também passei pelo processo de sair da universidade e começar a procurar emprego. Isso implicar um corte de relações, perda de contacto com colegas e amigos dentro da universidade, uma vez que, uns foram viver com os seus familiares, outros foram trabalhar para outras cidades ou mesmo para o estrangeiro e passou a haver um contacto mais à distância.
Trata-se de uma obra que foi poucas vezes encenada.
JP: Sim, esteve em cena uma única vez. Há muitos personagens e actores, o que torna muito complicado conseguir garantir um grupo grande em palco, obviamente, em termos de custos.
Fale-me um pouco do seu processo criativo em termos de dramaturgia. Como é que escolhe os temas para as peças, é através da constatação do quotidiano que o rodeia, ou pensa num tema e escreve, ou ainda recebe encomendas para o efeito?
JP: Há todas essas fórmulas, ou seja, muitas vezes as companhias estão à procura de determinados textos, regra geral para dois actores e então pedem-me um texto. Outras vezes é um tema, um episódio de algo que me interesse e então escrevo sobre ele. Depois há as ideias que surgem aparentemente do nada e vão-se formando e transformando em processos de escrita.
Existe momentos, ou algo, que torne o processo de escrita mais difícil ou não?
JP: Os processos mais difíceis podem ser na parte da escrita em que se procura tentar encontrar a forma certa para o texto, ou então há o processo de encomenda em que há um ajuste entre aquilo que desejo escrever e as expectativas da companhia, o que desejam encenar.
Em termos de peças de teatro, qual é a preferência do público português?
JP: Não creio que exista um público português de teatro, existem sim, diferentes audiências. Depende muito de tudo, da área geográfica, se é um público mais urbano, ou suburbano, ou ainda rural. Se é uma zona que tem universidade e isso também tem muito impacto em termos da frequência de teatro. Se vai até o teatro nacional, ou municipal, ou as companhias mais independentes, ou ainda que prefere musicais e peças de teatro com personalidade conhecidas da televisão.
Então qual é a escolha das audiências urbanas?
JP: Bem, é um público que vive e trabalha no centro das cidades, que tem um nível de educação mais alto e um poder de compra maior. Eles procuram o tipo de peças mais vanguardistas, de autores mais consagrados ou companhias com algum prestígio.
E o público rural o que procura no teatro?
JP: Procura peças mais ligeiras que tenham a ver com a situação portuguesa, comédias com música, ou obras que tenham uma componente mais forte de melodrama.
E das cidades com universidade em que se distingue das restantes?
JP: Para já, as cidades com universidade têm companhias próprias com estudantes que fazem teatro. Normalmente, esse público procura um teatro mais literário, ou mais próximo da performance.
Esses públicos acabam com conferir importância ao facto do autor ser português, ou nem por isso?
JP: Creio que não, a importância é dada nas situações que são retratadas, se virem que são episódios que de alguma forma lhes são próximos, isso, regra geral comunica com o público. Agora, se quem escreveu a peça é português ou não, não creio que tenha grande impacto.
Outra das suas facetas é o guionismo.
JP: Já escrevi mais, agora é mais raro.
Mas, quando o fazia o que distinguia a escrita de uma peça de teatro e para cinema?
JP: No cinema quase tudo é dado através da imagem, então a ideia é transmitir tudo visualmente, usando o mínimo de palavras possível. No teatro há a liberdade do texto, do falar das coisas, de descreve-las, algo que no cinema é muito mais difícil de acontecer.
Tem também contos publicados e esta a escrever um romance é isso?
JP: Sim. Mas, ainda não posso adiantar nada.
Destas facetas todas de escrita na sua vida, qual é a que prefere?
JP: Não consigo responder. Acho que interessa-me pontualmente a escrita por si, o poder que tem de transformar a forma de pensar das pessoas.
Como se define?
JP: Como escritor.
Mas, não apenas de livros?
JP: Também não há muitos escritores que sejam apenas de livros, basta ver que Saramago também escreveu peças de teatro.
Como é que olha para a sua profissão de dramaturgo no futuro num país como Portugal?
JP: Isso é uma pergunta muito complicada. Não creio que será uma actividade fácil, porque não creio que o teatro o seja em Portugal. Teve sempre muito sujeito aos altos e baixos da economia, de modo que será sempre acessório, mas espero que possa contribuir sempre para o dinamismo cultural do país. Actualmente, também há uma tendência geral ao nível europeu das peças serem mais visuais, usarem outros suportes, novas tecnologias e prácticas não tão dependentes do texto. A dramaturgia terá de ser de pensada num todo, numa experiência que é necessário articular de uma forma que faça sentido para o espectador.





