Tenho conhecimento que utilizam essa informação para criar roteiros, como desenvolvem esse objectivo?
SP: Existem roteiros elaborados por nós e as pessoas podem deslocar-se até centro de interpretação, ou consultar o site para o efeito. Há vários percursos elaborados que, permitem visitas de uma hora, ou um dia inteiro que consistem numa visita guiada, acompanhado por um arqueólogo por esses sítios arqueológicos assinalados pela APIA, que acabam também por contribuir para o desenvolvimento turístico da zona.
A outra vertente da associação, as bolas de estudo, recentemente elaborou o levantamento de múmias no território nacional, fala-nos um pouco sobre o tema. O que são essas múmias?
SP: Sim, uma das bolsas de mestrado que apoiamos foi sobre a evolução de biologia humana que consiste no estudo das múmias portuguesas. São corpos que não foram modificados pelo tempo, incorruptos, a quem a tradição popular atribui capacidade de realizar milagres e alguns até são adorados pelo povo como santos. A APIA apoiou esse estudo e a primeira fase do trabalho de campo que, consistiu na análise macroscópica do material. Actualmente, estamos a apoiar duas teses de doutoramento, uma de arte rupestre e a segunda, que é sobre os concheiros de Mugue. São sítios arqueológicos onde podemos encontrar moluscos e objectos confeccionados em silex, do período mesolítico, a cerca de 7 mil anos atrás.
Fala-nos agora um pouco dos potenciais achados nos Açores? De que se trata?
SP: Tudo começou com uma viagem de férias do nosso actual presidente, o Nuno Ribeiro aos Açores que, detectou potencialidades de interesse arqueológico naquela zona. Ao investigar com maior afinco as histórias da ocupação de algumas ilhas do arquipélago começou-se a perceber que na própria história de Portugal, há indícios que houve uma ocupação muito anterior à portuguesa. Existem moedas que foram encontradas na ilha do Corvo, algumas delas são fenícias e que foram adquiridas por um museu espanhol, houve até uma estátua equestre de que só se conhece um esboço. Algumas estruturas, que se crê serem funerárias, foram até apontadas pela população local que as utiliza para guardar gado. Não posso afirmar se foi temporária ou não, mas foi anterior aos portugueses.
Fenícios nos Açores?
SP: Porque não? Da mesma forma que afirmámos essa possibilidade, também tem de haver alguém que prove o contrário. As hipóteses são para serem testadas. Existem correntes marítimas que passam ao largo da ilha do Corvo e das Flores provenientes do Mediterrâneo, que podem ter propiciado esse desembarque fortuito ou não, mas é preciso escavar para provar ou refutar essa hipótese. Até uma análise da constituição física das pessoas, da sua anatomia, da evolução biológica é um indicador das características das gentes que passaram por ali. Todos esses estudos e inventários deveriam ser feitos.
A APIA contactou a Secretaria Regional de Cultural dos Açores, no sentido de estabelecer uma parceria para obter às permissões legais necessárias e algum apoio financeiro. A arqueologia é uma ciência e como tal é necessário desenvolver investigações para testar, comprovar, ou refutar hipóteses. Neste caso, existem alguns indícios que podem apontar para uma ocupação anterior à Portuguesa. Existem relatos na história que aliados a testemunhos materiais que podem fortalecer essa questão. Na arqueologia portuguesa existem alguns tabus e os Açores é um desses casos. Não há verdades absolutas. Alias, com a evolução de novas tecnologias e metodologias o que hoje é considerado X, amanhã pode ser Y e a arqueologia existe para isso, para esclarecer e também para construir e desconstruir hipóteses, teorias e mitos.
Qual é o balanço que fazem do trabalho desenvolvido pela associação nestes últimos doze anos? Qual é a evolução natural da associação?
SP: A intenção é continuar a financiar mais pesquisas e criar espaço para novas temáticas de investigação até mesmo na Serra da Estrela, onde ainda há muito ainda por fazer, especialmente as estruturas funerárias. Tudo também depende da situação financeira do país. É necessário dinheiro para levar á cabo estes estudos, a APIA precisa de parceiros para obter essas verbas que gerem lucros para conseguir financiar os projectos de investigação. Neste momento há uma estagnação muito grande. No entanto, não estamos parados. Existe a possibilidade de uma parceria com o Brasil, mas nada está decidido ainda. Estamos também a ajudar a organizar o Congresso Internacional de Arqueo-Astronomia que se vai realizar em Setembro, no nosso país.
O que é a arqueo-astronomia?
SP: É uma ciência que nos auxilia no estudo da arte rupestre. Analisa as orientações dos astros e as associações que estas gravuras tinham com o solstício de verão e com as luas cheias. Há uma série de ligações em termos de religiosidade, da pré-história e das sociedades actuais que são determinadas pelos astros. Existem algumas, na Serra da Estrela, que foram escolhidas a dedo, porque tem uma orientação Nordeste-Sudoeste, que está relacionado com o nascer e o pôr-do-sol.