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A conspiração dos fidalgos

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Alexandre rocha, engenheiro informático, estreia-se no mundo da escrita com um romance histórico sobre um evento pouco conhecido da história luso-brasileira que o acompanhou ao longo de mais de 15 anos e que finalmente passou para o papel sob a forma de livro.

Porquê escolheu aquele período especificamente? Pela óbvia associação ao Brasil?

Alexandre Rocha: A história deste livro é bastante comprida. Há dois tempos. Começou em 1995 com o renascimento do cinema brasileiro através da "Carlota Joaquina" de Carla Camurati, o filme marcou-me pela sua história e depois estive no Real Gabinete Português de Leitura, no Rio de Janeiro, e lembro-me de encontrar um livro muito antigo, pequenino, que falava sobre uma conspiração de fidalgos. Não me lembro de nenhum livro de história escolar falar deste evento, que de facto aconteceu, embora tenha ficado muito pouco por relatar. Tomei notas, mas nunca pensando que iria escrever um livro. Alguns anos depois a primeira parte do livro foi escrita, isto em 1997, mas esteve adormecida durante muito tempo. Até que recentemente, em 2010, tomei a iniciativa de restaurar a primeira parte que estava desactualizada em termos gramaticais, tinha sido escrita por um adolescente, na época com 20 anos e ao olharmos para atrás alguns dos nossos trabalhos, não digo renegar, nota-se uma certa inexperiência na escrita e só faltou mesmo sentar-me, reescrever e fazer as pesquisas que julgava pertinentes para termina-lo, porque a história em si esteve sempre na minha cabeça. Embora, não seja um livro de história, tenta é trazer um pouco da história ao romance.

Quando lhe surgiu a ideia para este livro, o intercalar entre o presente, o Brasil contemporâneo e o passado, o Brasil das grandes fazendas, foi algo pensado desde o início?

AR: Sim, particularmente este tipo de temática, o que é diferente, o oculto, atrai-me. Lembro-me da minha madrinha ter inúmeras publicações sobre o género, a revista planeta que ainda hoje é editada, abordava as ciências ocultas e todo o tipo de literatura ligada a estes assuntos. Desde o princípio o fim já estava escrito dessa forma, nem sempre escrevi de forma ordenada, refiz muito do desenvolvimento da história, mas outros capítulos já estavam bem escritos e esse em particular foi um deles.

O oculto, um certo misticismo, aparece no livro porque é brasileiro. É uma forte componente da cultura brasileira.

AR: Os costumes dos negros, toda a cultura dos orixás eram abordados na revista que referi anteriormente. Não se tratava de uma publicação feita por charlatões muito pelo contrário, eles tentavam abordar o oculto de uma perspectiva até bastante cientifica e lembro-me de ter lido grandes trabalhos sobre estas matérias. Na altura guardei na memória esse tema dos orixás, em particular, o exú, que é uma entidade que está mais próxima dos homens, fazendo uma comparação com as religiões monoteístas na cultura católica seria associado ao diabo. Quando escrevi o livro fui pesquisar a cultura africana no Brasil, porque é um aspecto importante da história. Lembro-me de uma obra que me marcou bastante que foi "o menino do engenho" de José Luiz do Rego. Esta obra para mim, foi fundamental, é um clássico da literatura brasileira, onde fui buscar essa memória do que é o nordeste brasileiro, do que era essa convivência com os escravos, tentei recriar um pouco essa época. Da parte portuguesa, há uma crítica mordaz, uma certa ironia e quem estiver habituado com a escrita de Eça de Queirós, que é para mim de longe o meu escritor predilecto, reconhecerá uma certa semelhança, que foi tentar beber, por paixão e gosto para este trabalho. Depois tentei passar uma visão do português comum, nesse sentido, uma das personagens, o Alberto, é a metáfora do que é o povo, a sua simplicidade, sua lealdade e amizade, embora também haja extremos, porque o Teófilo, é o anti-herói.

Reparei que utiliza uma terminologia própria quando fala do quotidiano na fazenda. Teve de fazer muita pesquisa para entender e poder descrever a dinâmica de uma fazenda de produção de cana-de-açúcar?

AR: Principalmente o "menino do engenho" foi uma inspiração muito grande. Lembro-me de uma parte em que o protagonista, o Miguel Herculano mostra a fazenda a Maria Carolina e fala da maquinaria e dos vários espaços. As pesquisas que fiz foram através da internet, embora esteja ligado as letras, estou também conectado ao mundo das tecnologias, por via profissional, licenciei-me em engenharia informática. Uma das críticas positivas que me foram feitas é o facto de não ter incluído toda a bibliografia que consultei e acho que é muito pertinente, por isso para a próxima obra estou a anotar toda as referências bibliográficas, seja virtual ou real.

O personagem Miguel Herculano tem uma vida muito aventurosa e atribulada, a sua vida amorosa, por outro lado, não é feliz, fruto da maldição do negro. Teve sempre esta ideia em mente?

AR: A maldição do negro é só uma parte. Eu deixo isso à consideração do leitor, será que a maldição do escravo é real? Será que é decisiva? As coisas de facto aconteceram por causa disso? O livro, claro, que o dá a entender que sim, mas também pode ser que não. Eu já tinha em mente o encontro daqueles dois personagens no final, a Maria Carolina e o Miguel, obviamente que não tinha cada detalhe estructurado na minha cabeça, esses detalhes foram nascendo fruto da pesquisa, em particular, a parte portuguesa que não estava propriamente escrita, foi mais trabalhada. Este final já estava decidido, porque nem sempre os finais são felizes. Tentei procurar o realismo, seria cómodo terminar um livro de forma bonita e açucarada. Pareceu-me que o mais normal fosse por aí, embora houvesse dias em que me sentava para escrever e não sabia o que iria fazer, ao longo deste processo de leitura e reflexão, porque escrever não é só inspiração é um trabalho árduo, houve dias em que senti essa dificuldade. A vida do personagem Miguel resultou um pouco desse processo de escrita.

Este foi o primeiro romance que publicou?

AR: Vamos dizer que sim. Vim para o mundo das letras, porque alguém me ajudou, me deu a mão e essa pessoa foi a professora Isabel Sodré, da minha escola técnica do Brasil, que olhou para os meus trabalhos e me ajudou a fazer uma revisão na minha escrita e aprendi muito com todo esse processo. Esse pequeno romance depois foi publicado numa pequena feira tecnológica, quando tinha 15 anos, mas posso dizer que este foi o primeiro livro a sério, esta é a minha primeira obra.

A conspiração dos fidalgos é tudo o que sonhou? Não tem mais nada a acrescentar? Ou retirar?

AR: É muito difícil de dizer se há mais alguma coisa para acrescentar ou retirar, como já disse, o livro é como eu imaginava. Até para a capa eu já tinha uma ideia pré-concebida e quando a editora a produziu estava um tanto quanto apreensivo, mas depois fiquei muito surpreendido com o resultado final, fiquei muito tranquilo quando a vi, tem um arranjo muito simples e de muito bom gosto. Não sei se tenho esse distanciamento, até porque estou a trabalhar em algo diferente já olho para atrás e penso, estou numa outra onda. Não sei se algum dia serei daqueles que renegam a obra, tenho é um carinho imenso pelo livro, é como se fosse um filhote.

Disse que esta a desenvolver um novo trabalho, é um novo romance histórico?

AR: Sim será um romance histórico, não tão profundamente vincado como "a conspiração dos fidalgos", mas por vontade própria meti-me num covil de vespas que é escrever sobre a temática da guerra civil espanhola. É muito difícil escrever sobre esta época, porque é um tempo de extremos e eu quero misturar aqui um pouco do ensaio e do romance histórico. Tenho procurado transportar esta visão dos tempos, através de uma percepção crítica. Terá duas histórias, uma mais actual e a outra que nos remete para essa altura, haverá uma interconexão através das personagens e aparece mais uma vez o lado místico.

Será um livro para editar já no próximo ano?

AR; Não tenho uma data certa, escrevo e pesquiso quando o tempo me permite. É difícil conciliar a escrita com a minha profissional. "A conspiração dos fidalgos" foi escrita durante cinco meses, foi uma época difícil, eu trabalhava numa fábrica de Vila do Conde, na Quimonda que fechou e como estive parado nesse tempo, achei que era uma oportunidade para escrever, estive o tempo inteiro envolvido nesse projecto, sem parar. Actualmente é mais difícil quando se esta a trabalhar, o tempo que utilizo é o excedente, funciona por paixão, só se faz isto porque se gosta. Hoje em dia é muito difícil viver deste ofício, são raras as excepções.

Se pudesse optar deixava a engenharia e ficava-se pela escrita? Ou mantinha sempre estes dois mundos paralelos?

AR: Eu acho que mantinha os dois mundos, porque é-me muito difícil não estar sentado em frente ao computador, acabámos dragados pelo nosso ofício. Eu sou uma criatura de dois mundos, seria difícil separar.

Qual é o seu género literário preferido?

AR: O romance histórico e o ensaio. Agora tenho imensos livros sobre a guerra civil espanhola, embora o literário esteja muito presente, com o Eça e José Luiz do Rego. Sou um prosador por natureza.

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