Abordando essa temática, só muito recentemente apostastes nos acessórios. Porquê agora?
PP: Comecei a cerca de dois anos com as malas. Na moda Madeira, eu tinha alguns acessórios. Agora são ainda mais personalizados, porque tenho a minha irmã que faz as malas e o Ricardo Silo que vai idealizar toda a parte plástica dos cabelos, não só vai fazer penteados, como também criou adereços originais com pormenores muito bonitos. Ele é um artista, para além de cabeleireiro, dá-me imenso prazer trabalhar com ele, porque falámos mesma língua, estamos muito sintonizados. Vamos sempre evoluindo no nosso trabalho, querendo sempre mais. Vou apresentar também colares.
Porque não sapatos?
PP: Adoraria. Eu se não tivesse sido mãe tão cedo, aos vinte anos, teria ido até Itália para fazer um estágio em calçado e criar padrões para tecidos, porque acho que é maravilhoso. Esses eram os meus dois sonhos. Neste momento é muito complicado gerir tudo, a cada ano quero dar um passo diferente e se calhar vamos chegar lá. Eu vou sempre querer melhorar e complementar as colecções de forma personalizada. Depois as pessoas que estão a trabalhar comigo vão também ajudando a criar essa área complementar do trabalho. Vão-se motivando, todos nós fazemos brainstorming e vamos rematando tudo dessa forma.
Como é a mulher madeirense? Notas uma evolução?
PP: Sim. Eu sempre vi a mulher madeirense de uma forma particular. Nós vemos em Lisboa mulheres bem vestidas quando saímos á noite. Cá diferimos, porque gostámos de arranjar-nos mesmo para o dia-a-dia. Pelo menos o leque de madeirenses que se encontram próximo de mim. Porquê? Vivemos num meio pequeno, há uma necessidade de ser autêntico e estar bem. Normalmente, nas festas vemos sempre as mesmas pessoas e elas gostam de inovar, de mostrar algo diferente. A forma como nos vestimos ajuda a tornar-nos únicos, bonitos e diferentes, para sentimo-nos bem. Há essa procura, não massificar tanto, comprar uma peça personalizada e noto que existe esse prazer de mostrar algo diferente. As mulheres também se vestem umas para as outras, isso acontece muito, sinto essa preocupação.
Voltando atrás no tempo, tu por norma não segues as tendências, a ano passado fizestes uma colecção inspirada em África?
PP: Sou sempre atenta às tendências da moda, que acabo por usar em pequenos apontamentos. Na colecção Yangu Afrik, que traduzido é África minha, as pessoas ficaram com a impressão que tinha lá estado. Naquele meio. Mas, não. Acho que foram as revistas do National Geographic que a minha mãe assinava que me inspiraram! (risos). Eu sempre as li. Segundo ela, eu era muito vivaça e não parava. É o meu universo de memórias ao qual eu recorro, esta tudo na minha cabeça. A transposição dessas cores estava no meu subconsciente. Eu nunca estive em África. Esta é tudo cá dentro. É um pormenor que me chama à atenção. Um tecido. Uma folha caída. São pequenos apontamentos que encontro pelo caminho que me despertam essas memórias e que depois transponho para uma peça, que dá origem a outra e de repente tenho uma colecção. Acho que é muito importante estar sempre a par de tudo o que está a acontecer no mundo para nos sentirmos perto e não tão isolados. Só que eu acabo sempre por fazer uma interpretação do que para mim é importante, do que gosto, do que é harmonioso e sou muito fiel a mim própria. Não gosto de adoptar nada, só porque é uma tendência. Tenho que ter uma coerência com o que sinto e que flui nessa altura. Ajuda muito.
As malhas dessa colecção são extremamente ricas e elaboradas. Não tivestes dificuldade em encontrar alguém que fossem ao encontro do teu nível de exigência?
PP: É verdade. Existe um trabalho muito grande, porque ao entrarmos numa loja de lãs, vemos um fio, que é apenas isso. Eu tenho que escolher fios e conjugar texturas. Na própria malha que estou a criar, a pessoa que o vai fazer tem que falar a mesma linguagem, portanto, temos de estar bem sintonizadas. Eu tenho que criar cada padrão e construir no papel cada picotado para então ser transposto para a máquina. São como um jogo da batalha naval, temos que desenhar pontos para cada uma das quadrículas. No inicio tive dificuldades em encontrar pessoas que estivessem dispostas a fazer esse trabalho, depois uma senhora veio ter comigo, ela é fantástica, tem esse querer, essa vontade de fazer diferente. Estava também cansada de fazer tudo à antiga, da forma mais tradicional e queria desafios. Ao princípio foi difícil quando tentava uma aproximação diferente, depois entrou nesse ritmo e queria mais e melhor e dou-me de conta que ela sabia, mais do que ela e eu própria julgava. (risos).
A tua opção pelas malhas não foi um elemento estranho ao princípio, para as tuas clientes? Este é um clima semi-tropical que nem sequer tem um inverno rigoroso.
PP: É por isso que eu escolho fios mais suaves, há alguns que são lindíssimos, mas que não posso usa-los porque são adequados apenas a climas como da Sibéria. (risos) O que faço? Procuro usar fios mais grossos nos coletes. Nos casacos conjugo uma lã mais fina com uma mais quente, faço apontamentos de riscas de modo a que a peça, que apesar de ter todas aquelas cores, depois de vestida é muito leve. Tem todas aquelas texturas, todos aqueles pelos, mas acaba por ser menos quente do que se esperava. É óbvio que o nosso clima é mais ameno do que no resto do país, eu acho piada que tenho clientes que me dizem que vão usar a peça mesmo com calor, “precisam” de sofrer, só porque gostam tanto dela. (risos) Nós rimo-nos e já me aconteceu isto. Depois tenho aquelas que vão viajar a aproveitam para usar as malhas. Tento no entanto ter atenção a isso. Este ano encontrei fios óptimos, macios, que são feitos para usar como uma camisola por dentro, uma calça de ganga e já estamos vestidas com essas malhas, porque tem muita força em termos de imagem e sentimo-nos bem com elas.
O que representou para ti o Portugal Fashion em termos de carreira?
PP: Notei sobretudo o respeito das pessoas cá por mim. Até ir até o PF gostavam do trabalho, mas não me olhavam dessa forma. É estranho, mas estar lá confere outro valor, se ela está lá é porque é muito boa. O trabalho que fazia era o mesmo, mas, estar inserida no contexto nacional e junto com um leque de profissionais da mesma área, destacou-me. Em termos, experiencia pessoal foi óptimo. Tive esse convívio com grandes nomes da moda portuguesa, pude falar, trocar contactos e perceber em que ponto estava na minha carreira, onde me situava e o que sentia em relação do trabalho dos outros. Porque não continuei, no PF? O primeiro motivo diz respeito aos custos. Somos nós que arcámos com tudo, são custos elevadíssimos. Sair daqui com uma colecção enorme e a estadia, tudo isso, implica um investimento financeiro significativo. Depois, precisava de ter alguém que desse continuidade ao meu trabalho lá. Tive durante um ano, as peças no showroom, mas o valor mensal era levado. As revistas de facto usavam as roupas para as produções de moda, mas o meu objectivo não era fazer vários tamanhos da mesma peça, o meu trabalho é individual, único e não consigo faze-lo seriado. É muito difícil para mim. A minha colecção também esteve na Muda, no Porto, mas não conseguia competir em termos de preços com os restantes estilistas, porque eles conseguem fazer as peças em fábricas, eu com as minhas peças de ateliê não conseguia competir com esses valores. Tudo isso acabou por condicionar o meu seguimento. Houve depois uma situação no PF, que me desmotivou, o director da Anje na altura disse-me que iria apresentar a colecção em Lisboa em conjunto com um grupo de estilistas, é obvio que gostei da ideia, de estar na cidade onde estudei e comecei a ter uma ideia muito precisa para a colecção. Duas semanas antes do evento, dizem-me que tudo foi cancelado e que seria em Gaia, numa tenda junto ao Corte Inglês. Eu achei que se eu me dedicava tanto, era uma falta de respeito mudarem tudo na última da hora e senti que não era esse o meu objectivo. Disse-lhes que para dignificar um evento dessa natureza e o trabalho de todos, não se fazia esse tipo de produção numa tenda. Mantive essa posição e pensei que já tinha esgotado o meu tempo no Portugal Fashion e que outras oportunidades iriam surgir. Foi um ponto de viragem.
O que achastes da moda madeira foi um evento muito pontual.
PP: Foi. Quando começou achei óptimo, porque havia uma interacção com estilistas nacionais e para nós era fantástico porque mostrávamos duas vezes por ano aquilo que fazemos melhor. Se não, as coisas morrem, não tem sentido criar. Foi uma experiencia de 3 anos, que de repente parou. O projecto ficou pelo caminho, tive muita pena, mas depois pensei que não podia parar. Foi aí que decidi, vou mexer-me, pedir patrocínios e apresentar a minha colecção anualmente. Nos últimos dois anos foi na Casa da Luz, a Luísa Garrido, a responsável pelo espaço, foi sempre espectacular comigo e todos em termos gerais. Este ano, noto que vem sendo cada vez mais fácil criar este tipo de evento, porque as pessoas já me conhecem e sabem do meu empenho e de toda a equipa que trabalha comigo.
O que vai ser o futuro de patrícia Pinto?
PP: Eu costumo dizer deixem-me viver o momento, se o fizer com toda a vontade, com toda a dedicação e toda a força, há-de acontecer algo bom. Não projecto. Tenho os meus sonhos. Gostava de participar na moda Lisboa e um São Paulo Fashion Week, ou a Paris. Gosto de sonhar alto. Cada dia é uma surpresa e vou vivendo dessa forma.