Sim, mas de que forma isso se traduz nas jóias?
GR: Traduz-se através dos quadros imaginários que cada uma tem. Eu baseio-me muito numa paisagem urbana e dalí nasce uma jóia. Isso acontece muito no meu trabalho.
Depois de captar essa imagem como surgem os materiais?
GR: Isso é algo que acontece de forma empírica, às vezes penso que fica bem uma pedra de xisto, ou uma pedrinha que encontrei no rio, ou no mar, ou depois decido que fica apenas o metal. Por vezes, o processo acontece ao contrário, encontro materiais que vão servir para alguma coisa e passado algum tempo surge uma ideia para dar azo a forma daquele material. Acontece um pouco assim, já são 22 anos neste imaginário, nesta construção forte e isto já me esta no sangue, como se diz.
A escolha de materiais não convencionais aparece desde o início da sua carreira?
GR: Aparecem a partir do momento em que começo o curso de artes na ESAD, em 1997.
Então porque a continuidade em usar essas materiais tão inusitados?
GR: Acontece, porque os próprios materiais tem mensagens. Tem um significado especial para mim e quem adquire as peça as perceba. Às vezes também tenho que o comunicar, posso dizer em que há uma série de peças em que uso uma terra vermelha, que existe na Serra de Santo António, onde a minha mãe nasceu, em Leiria, e isso tem um significado muito grande, somos todos da terra e porque me lembra minha mãe que foi uma heroína para mim. Quando uso esse material orgânico lembro-me da mulher forte, que nunca olhava para trás, certo ou errado, ela ia em frente, lutava e vencia os seus obstáculos. Portanto, ao usar essa terra e algumas pedras que vou encontrando por onde passo, essas rochas calcárias que tem as marcas da austeridade desse clima da serra. Eu dou muito valor a isso, a uma pedra que teve um desgaste ao longo dos séculos, provocados pelo tempo, pela chuva, por tudo. Ao contrário de uma pedra bonitinha e lapidada, que para mim não tem significado nenhum. Quando uso esses materiais parece que os estou a abraçar, isto porquê? É preciso por vezes conhecer bem os locais, que tem também um significado, onde apanho os meus materiais. Estive recentemente numa aldeia de xisto da Serra da Lousã e vi uma casa completamente degradada, com os materiais espalhados por todo o lado, perguntei se podia levar e disseram-me que sim, peguei em telhas com as quais fiz várias peças que vendi no Natal passado. Não vivo muito preocupado com estas coisas da inspiração, não tem significado.
Das colecções que executa em número limitado,qual é a que melhor o define? Ou acha que esta bem representado?
GR: É precisamente as peças em que uso os materiais com uma mensagem muito forte, como no caso da terra vermelha. É um anel com a representação de dois ciprestes, que quase não se consegue practicamente usar, mas o objectivo é mesmo esse, mais para admirarmos para contemplarmos a paisagem, ou a pessoa que esta lá representada. É isso que mais me preocupa. É óbvio que também faço peças que são para usar, eu vivo do meu trabalho. Agora, eu gostaria de fazer apenas este tipo de peças, mas não é possível, é necessário ter um estatuto, ou plafom para aguentar, é difícil viver na arte, muito menos neste período. Mas, gosto de peça em que fiz com uma pessoa a ler um livro, ou com as pedras polidas pelo mar que encontro na praia de Leça, com elas faço alfinetes para as poderem contemplar, porque são tão bonitas e tem uma mensagem tão forte.
E o imaginário africano existe ou não?
GR: Eu efectivamente nasci em Angola, mas vim muito cedo, tinha apenas 10 anos. Eu nunca pensei nisso, mas nunca me preocupou, se calhar o imaginário africano exista, e volto à terra vermelha que gosto de comtemplar, porque em África a terra é também dessa cor e os pôr-de-sol eram muitos fortes, disso lembro-me. Provavelmente tudo isto tudo esteja interligado no meu íntimo, mas trabalhar esse tema nunca o fiz.