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A mindjer de bissau

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Karyna Gomes é uma das novas vozes da música de Guiné-Bissau. Seu primeiro álbum, chamado Mindjer, é dedicado a todas as mulheres do seu país e embora tenha essa identidade africana bastante vincada, através da percursão e da voz, é um disco recheado de sonoridades quentes de outras paragens que a influenciaram ao longo da sua vida.

Decidiste dedicar este trabalho discográfico às mulheres, mas há todo um universo muito feminino nas tuas músicas, na Guiné-Bissau, a música começa com as mulheres? Falaste de um instrumento, a tina e o porquê das mulheres o usarem.
Karyna Gomes: A mulher esta muito na música na Guiné, desde o contexto mais étnico digamos assim, o pré-colonial, como num contexto já mais mestiço, pós-colonial. Ela esta presente em tudo, lidera associações, toma conta dos filhos, da casa, esta na agricultura, na pesca, no governo e é o sustentáculo das famílias guinienses. Elas andam quilómetros à procura de água, para irem ao mercado vender, fazem milagres e é tão difícil da vida de uma mulher guiniense, porque a tradição ainda a penaliza muito, é considerada um ser inferior, que tem de baixar a cabeça e servir o homem. Isso faz com que estas mulheres sejam verdadeiras heroínas, porque socialmente ainda sofrem com problemas muito sérios. Eu costumo dizer que o governo de qualidade esta nos lares guinienses, a mulher é o melhor exemplo de governação, porque faz mil coisas ao mesmo tempo e bem.

Então porque só escolheste esta altura para lançar este teu primeiro disco? Eu sei que só agora encontraste a editora na qual te sentes reflectida.
KG: Porque eu fui para o Brasil para fazer um curso, em 1996, em comunicação social, sou jornalista de formação e durante esse período fiz parte de um grupo de gospel e comecei a cantar. Costumo dizer que foi tirar um curso e que Deus mostrou-me o meu verdadeiro caminho, só que não foi fácil, ao voltar para a Guiné-Bissau foi trabalhar como jornalista na RTP, estive em rádios comunitárias como radialista e formadora, pelo meio tive uma filha e isso tornou tudo mais complicado, deixar a minha criança para correr atrás do sonho. Para conseguir o disco que queria teria de sair do meu país, bater nas portas das editoras e conseguir alguém que acredita-se no meu talento. Mas, o que aconteceu não foi isso, tive que trabalhar, fiz parte de instituições importantes, como a Unicef, mas depois achei que tinha de deixar isto de parte, não para sempre, porque continuo a fazer alguma coisa, mas decidi seguir o meu sonho, porque pensei que quanto mais adiava, lá para frente ia arrepender-me. Durante o tempo em que não gravei, pesquisei muito sobre a história da música da Guiné-Bissau, dos seus instrumentos, eu fiz muita investigação, neste momento estou a fazer um mestrado e falta-me a tese. Acho que o disco chegou no momento certo em termos de maturidade, em que tenho uma ideia clara, eu demoro para perceber como as coisas devem ser e o que devo fazer, agora sei mais o que quero fazer.

Qual foi a linha condutora para este álbum para além dos instrumentos? Eu apercebi-me de uma influência da música cubana com essa fluídez enorme.
KG: O meu disco tem muita influência cubana e vou explicar porquê, teve uma revolução que foi fortemente apoiada pelos cubanos e muitos foram para a Guiné e com eles veio a música. Eu nasci dois anos após a independência, os meus pais tinham muitos amigos cubanos que levavam a sua música, partilhavámos conversa e sonoridades. Para além disso, sou sobrinha de um dos grande ícones da música guiniensa que é o Micas Cabral, dos Tabanca Jazz, ele esteve em Cuba a estudar e quando voltou trouxe muito do “buena vista social clube” na altura em que eles nem sequer eram conhecidos. Eu bebi muito dessa fonte cubana, foi algo maravilhoso, depois, por ter estudado no Brasil também tive muita influência da música brasileira, mas ouvi mais gospel, mas antes sequer de ir para lá eu já ouvia Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Roberto Carlos e outras tantas estrelas.

És muito eclética no teu gosto musical e isso acaba por ter influência na música que fazes?
KG: Sim, sempre. É subconsciente.

Mas, começa como?
KG: Depende. Há dois dias lembrei-me de uma música que veio do nada, na cozinha, que é o meu lugar favorito, porque gosto de cozinhar. E de repente, a arrumar e limpar, paro, porque veio-me a melodia e vejo uma música inteira. Também é resultado das muitas coisas que ouvi, por vezes, é só melodia e depois vem a letra, ou vice-versa e quando vou arranjar os temas verifico que há muita coisa, esse tema de que falei relembra muito o afro-mandinga que é o estilo que inspirou o blues e tem muito de soul, portanto, quando vou ver, as minhas músicas são muito fundidas, a música que faço vai ao soul, ao R&B, ao brasileiro e é muito afro-cubana. Depois de ter gravado o álbum é que foi percebendo o quão grande é a influência da música cubana na minha vida e foi muito do facto de ser o som da minha infância, quando somos criança é quando parece que as coisas nos influenciam mais.

Também apelidas a tua música de urbana.
KG: Sim, porque eu sou de Bissau, sou africana urbana e não só, eu ouviu muita música tradicional e étnica, mas sobretudo da década de 60 o que se fazia na Guiné-Bissau era o que nos chamámos de música moderna guiniense. Eu pego nisso tudo e acrescento mais coisas, é por isso que a crítica portuguesa chama a minha música de nova música da Guiné-Bissau, porque não é uma sonoridade em estado puro, há um formato que se enquadra nessa estética que aparece no final da década de 50 e início dos anos 60 e que vai ser consolidado na década de 70 e 80 e que agora se esta a perder um pouco. Eu pego nisso, entretanto viajei muito, ouvi também muito jazz, cantei com uma formação jazzística e é incrível como tudo fica na nossa cabeça e quando vamos compôr tudo vem naturalmente. Não gosto de nada forçado, se me pedem para fazer uma música é mecânico, não é espontâneo.

Então pode-se dizer que a tua música é de fusão?
KG: Sim é a típica música de fusão. É para todos os ouvidos, porque qualquer pessoa se identifica com alguma coisa nos meus temas, por exemplo, estive num festival em que havia uns cubanos, eu tinha um percurssionista nas congas muito forte e eles no público ficaram maravilhados, disseram até que como anunciaram uma cantora da Guiné-Bissau que iam ouvir música africana, tem muito disso, mas há muito de cubano, até porque foram os nossos irmãos da luta.

Tu estas a promover este disco, mas já estas a preparar um segundo trabalho?
KG: Sim. Acho que a pesquisa de 2005 que foi quando comecei até 2015 são dez anos que dava para três álbums e se eu quisesse podia gravar já um segundo disco e ficar só à espera da momento certo para o lançamento.

Qual seria a diferença entre um e outro, já que fazem parte da mesma pesquisa?
KG: A diferença é mínima, a única certeza é que no meu próximo álbum não terei tanta coisa, porque neste disco quis mostrar de onde saí, que tenho uma raíz urbana que é música de repercursão, voz e tina, tenho dois temas de música moderna, da década 60 e canções minhas resultado dessa fusão. O meu segundo trabalho discográfico vai ter mais temas meus, vai manter a raíz que é tocar a tina, cantar ao vivo e a voz e a percursão. Vou manter esta sonoridade, porque me deu muito trabalho criar uma identidade, posso gravar um tema mais antigo, mas com uma outra roupagem. Acho que não vai haver diferença, se calhar mais composições minhas para o próximo álbum, com a minha forma de cantar, de estar na música e interpretar clássicos que é sempre um grande desafio e às vezes não é fácil, ao contrário dos temas que componho que são mais fáceis de cantar.

http://tutaudio.su/mp3-album-mindjer-download-7028945.html

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