O outono domina a paisagem com os seus tons dourados e verdes secos, mantas piam no alto dos céus para dar-nos as boas-vindas, no entremeio ouvem-se os sussurros da ribeira que se avista no fundo da ravina. Ao longo da levada encontrámos vários dos famosos furados, grutas que penetram a montanha basáltica e somos brindados por castanhas selvagens amadurecidas caídas no solo. As reminiscências da minha infância ganham cores quando recolho estes frutos generosos do chão e retomo um velho hábito, descasca-los e come-los crus. Mas, não são apenas os ouriços que se atravessam no nosso passeio, troncos de árvores tombados pelas tempestades cobrem parte deste trajecto de água, que ao longo dos séculos levou vida até as pequenas colheitas dos agricultores madeirenses. No passado, toda esta paisagem recortada pela mão do homem cobria-se de vários tons, cada um denunciava os frutos e vegetais cultivados, agora, as silvas e as ervas cobrem toda essa história cavada no solo. Os palheiros, pequenos compartimentos, onde se guardavam os animais e os frutos da labuta diária, estão votados ao abandono, mas pouco importa, a natureza usurpou mais uma vez o seu território, tudo está coberto de um verde pujante, recortado pelos esqueletos cinzentos das árvores que restaram dos últimos incêndios que quase feriram mortalmente a paisagem de Gaula. A vida, no entanto, renasce. E a paisagem começa a humanizar-se ao aproximar-nos do final, à Camacha, onde já se avistam pessoas e casas que invadem sem pudores o percurso. A vereda continua até o Monte, mas por hoje, ficámo-nos pela capital da cultura popular madeirense. Até o próximo passeio.